Recentemente voltei de uma visita ao Arshavidya Pitham, ashram de Swami Dayananda Saraswati, em Rishikesh, uma cidade sagrada à beira do rio Ganges, onde tive a boa fortuna e o bom karma de ser aceito, pelo pouco tempo que lá fiquei, no curso regular de Vedanta, de três anos de duração, que estava em andamento.
Esta comunidade de estudantes e praticantes de Vedanta, que segue os moldes tradicionais estabelecidos pelo grande filósofo e reformador Sri Shankaracharya, há mais de mil anos atrás, destaca-se da comercialização evidente em outros lugares por seus vários aspectos superlativos.
Impressionam neste ashram a qualidade e seriedade do ensinamento, a profundidade das meditações, a devoção dos rituais, a coerência e motivação dos residentes e o preparo espiritual, humano e intelectual dos professores.
Existe um enorme contraste entre essa experiência na Índia e o panorama do Yoga que é visível no Brasil. É freqüente encontrarmos na terra do Yoga sábios comprometidos com a prática e o estudo desde a mais temprana idade, verdadeiras encarnações da devoção, da abnegação e da dedicação ao ensino e à ação desinteressada.
Enquanto isso, operam aqui em nossa terrinha alguns ‘yogis profissionais’ que fariam corar de indignação seus colegas de qualquer época ou lugar. Em algumas lugares, o Yoga virou um ‘comomodity’, usado por professores facínoras para roubar, deslumbrar, enganar ou corromper o público.
A picaretagem não é nova no meio do Yoga. O Dattatreya Yogashastra (I:63-64), um antigo tratado sobre esta nobre filosofia, já nos advertia na Idade Média sobre a presença de pessoas despreparadas ou mal intencionadas: ‘Há algumas pessoas que dão discursos sobre Yoga ou ostentam os sinais do yogi mas não praticam. Estes estão enganando as pessoas, somente para obter benefícios pessoais e satisfazer seus desejos’.
Desde ‘mestres-empresários’ inescrupulosos a temerários que se lançam a ensinar o que ainda não aprenderam, impera no Yoga um clima de impunidade muito fértil para que os oportunistas e deslumbrados de plantão façam suas colheitas.
Por exemplo, se seu professor precisou colocar no currículo dele que aprendeu a tocar trombone com o melhor trombonista do Tocantins, ou que é formado em computação, talvez tenha faltado a ele paciência e perseverança para ter alguma experiência mais significativa dentro do Yoga com a qual rechear sua folha.
A bem da verdade, tocar trombone ou estudar informática são atividades muito nobres, mas que não qualificam ninguém para ensinar Yoga. Para dizer o mínimo, este tipo de apresentação de um professor de Yoga é propaganda enganosa. Um currículo de Yoga se constrói com experiências de Yoga, décadas de prática, contato contínuo com um guru ou professor por longos períodos, retiros, viagens de estudo e muitas leituras sobre Yoga.
Vejo essa pessoas como crianças brincando com granadas, que não têm a menor idéia do que estão fazendo, não conhecem as ferramentas que estão usando nem os potenciais perigos a que se sujeitam e sujeitam àqueles que praticam com eles. Esses professores acabam transmitindo uma versão tão distorcida do Yoga que ele acaba virando ginástica com cheiro de incenso.
Tentativas apressadas de diluir o Yoga para que seja melhor vendido ou aceito podem fazer com que perca sua essência. Cabe lembrarmos que o Yoga, seja da modalidade que for, inclui necessariamente alguma forma de meditação. Se seu instrutor não lhe ensina meditação, você está sendo enganado. E meditar não significa ficar cinco minutos deitado ou sentado aguardando a transpiração secar ou recuperando o fólego antes de sair da sala.
Lembro das sábias e bem-humoradas palavras de Swami Dayananda: ‘Se a pessoa tiver uma inclinação natural pela atividade, ela irá identificar-se com e praticar o Yoga da ação consciente, Karma Yoga. Se ela for emotiva, poderá identificar-se com o Yoga devocional, Bhakti. Se tiver propensão a usar o intelecto, poderá praticar o Yoga da discriminação, Jñana Yoga. Porém, se ele não prestar para mais nada, irá escolher o Yoga físico, Hatha Yoga’. E, desses últimos, alguns optam por ensinar…
Pedro nasceu no Uruguai, 58 anos atrás. Conheceu o Yoga na adolescência e pratica desde então. Aprecia o o Yoga mais como uma visão do mundo que inclui um estilo de vida, do que uma simples prática. Escreveu e traduziu 10 livros sobre Yoga, além de editar as revistas Yoga Journal e Cadernos de Yoga e o site yoga.pro.br. Para continuar seu aprendizado, visita à Índia regularmente há mais de três décadas.
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Enfim, li um artigo que bate com que penso e sinto sobre pessoas dando aulas de Yoga sem estarem devidamente preparadas. São realmente crianças brincando com granadas. Concordo com isso, porque eu mesma já brinquei com granadas, mas por pura “inocência”, para não dizer “ignorância”. Desde minha primeira formação como professora de Yoga, em 1998, minha vida tornou-se um constante “estudo”. Constantemente participando de vivências, cursos, práticas, finais de semanas dedicados só ao estudo, tudo sempre com muita responsabilidade, mas, mesmo assim, sempre me vem esse questionamento: “Será que estamos mesmo preparados para sermos professores de Yoga?” Em 9 anos dando aulas de Yoga, nunca aconteceu nada nas aulas que eu não tivesse o dominio para aquela situação. Mas já presenciei manifestações físicas totalmente novas para mim em outras aulas de Yoga, onde percebi que ainda preciso estudar e praticar muito ainda.
Adorei, Pedro! E espero que todos os que estão nos ensinando a mexer com granadas saibam que “granadas explodem” ao menor descuido.