Fui apresentado a Sting no começo de 1993 por meu amigo Danny Paradise, um yogi-músico que viaja o mundo e é professor particular de Sting. Sting e sua mulher, Trudie Styler, vieram a meu centro de Yoga em Santa Barbara à noite, depois de um show, para passar alguns dias praticando Yoga e conhecer alguns de meus amigos vindos da floresta amazônica. Nossa amizade nasceu de nosso amor mútuo pelo Yoga e pela natureza.
A maioria das pessoas conhecem a enorme contribuição de Sting para a música popular. Ele começou sua carreira como professor de literatura numa escola inglesa para meninas, mas logo mudou de rumo para seguir sua vocação musical e se tornou lider da banda The Police. Desde o início da banda e dos tours na sua van, Sting levou a banda ao sucesso, acumulando muitos Grammies e discos de ouro. The Police foi uma das bandas mais influentes dos anos 1970, pioneira em um novo estilo de alta-energia, combinando música e mensagens.
Sting continuou seguindo a carreira solo explorando a fusão de muitos estilos musicais e culturais, e transmitindo mensagens de alerta e conscientização. Ele é reconhecido não só como um grande cantor e tocador de baixo, mas também com mestre lirista e poeta cujas canções de concientização política falam de paz e amor.
Muito freqüentemente as estrelas brilham na arte mas não brilham em suas vidas. Esse não é o caso de Sting. Grande parte da sua energia tem se dirigido ao que se pode chamar de Karma Yoga, a serviço do mundo. Ele doou milhões de dólares em favor da paz de causas ambientais e sociais como a Anistia Internacional. Sua fundação da floresta tropical ajuda povos indígenas e salvou milhares de acres de florestas no Brasil.
Sting vive com Trudie e seus cinco filhos a uma hora de Londres, num castelo perto de Stonehenge. A casa é centro de atividade constante, recebendo um fluxo de visitantes do mundo inteiro. Trudie tem uma lista de feitos tão impressionante como Sting. Ela é atriz treinada pelo Royal Shaskespeare, diretora de cinema e diretora da fundação da Floresta Tropical e uma ávida yogini. Seu filme premiado “Moving the Mountain”, filmado na China, sob oposição do governo, documentou a luta dos líderes do movimento democrata na Praça da Paz.
Sting e sua esposa Trudie confiam no Yoga para manter e ajudar o bem estar e o ritmo de alta energia de suas vidas. Tive oportunidade de praticar Yoga com eles na Inglaterra, Califórnia e New York. Embora Sting diga que é um iniciante em Yoga, eu o vejo como um adepto, não só porque ele desempenha os ásanas com sinceridade, graça e elegância, mas também porque ele manifesta integridade, insight e compaixão.
Recentemente Sting e eu conversamos em sua casa em Malibu, sob o céu, à beira do mar.
Ganga White: Muitas pessoas tem se inspirado e interessado pela sua prática de Yoga. Você pode nos dizer o que o levou ao Yoga?
Sting: Eu cheguei ao Yoga já tarde em minha vida. Estou provavelmente no meu quarto ano de Yoga, o que significa que comecei quando tinha 38 ou 39 anos. Lamento não ter começado antes. Acho que eu estaria muito além se eu estivesse começado antes. Mas também é possível que eu não estivesse preparado. Fiz muitos regimes para manter a forma antes. Eu costumava correr cinco milhas por dia e fiz aeróbica por algum tempo. Eu sempre fiquei em forma porque eu sou um performer e isso me ajuda a me apresentar. Mas foi só quando encontrei Danny Paradise, que se tornou meu mestre de Yoga, que eu começei a praticar. E eu sinto que isso vai ficar comigo para o resto de minha vida. Eu sinto que é um caminho que é envolvente o bastante para continuar se desenvolvendo. De certa forma é como a música. Não há um fim.
Eu acho que uma vez que você tenha conseguido correr cinco milhas num tempo razoável, a medida que você envelhece, você pode manter este limite ou as coisas podem piorar. Isto é bastante frustrante. Eu acho que uma das coisas mais fascinantes em relação ao Yoga é que a medida que envelheço parece que fico melhor em partes de minha prática, o que é muito motivador. Faz com que você tenha vontade de continuar. O Yoga, no mínimo, está revertendo o processo de envelhecimento. Eu consigo agora fazer coisas com meu corpo que eu nem sequer imaginava fazer quando eu era um atleta, um adolescente. E é isso que me faz continuar. Isto é algo que eu quero continuar fazendo.
Ganga White: Como você encontrou Danny?
Sting: Através de um guitarrista, Dominick Miller. Danny é músico e ele encontrou Dominick tocando num restaurente um dia e acabaram tocando juntos em tudo quanto é lugar. Eu estava acabando a pós-produção do meu álbum “The Soul Cages”, quando Dom chegou e perguntou se eu gostaria de aprender Yoga com seu amigo. Eu realmente não sabia nada sobre Yoga. Eu imaginava que você simplesmente ficaria sentado no chão de pernas cruzadas contemplando o seu umbigo. Jamais imaginara o Yoga como algo que pudesse me interessar. Eu me interessava por trabalhos mais agressivos. Mas Dominick me disse: “na verdade você vai ficar surpreso. Tenho praticado um pouco e fisicamente exige muito”. Eu concordei em experimentar e Danny veio ao studio de mixagem no final de uma sessão e disse que me mostraria algo de Yoga. Eu pensei: “Estou em boa forma; isso vai ser fácil”. Tenho que admitir que em 20 minutos ele acabou comigo. Havia uma grande frustração no meu orgulho e minha auto-estima por não conseguir fazer as coisas que ele estava fazendo. Na verdade, quanto mais demonstrava mais parecia-me que ele era de outro planeta em termos de equilíbrio, força, flexibilidade e graça. Então eu disse: “Isto é pra mim, venha à minha casa amanhã. Conheço mais alguém que também se interessará por isso. Minha mulher Trudie”. Ambos estamos procurando algo diferente, algo a mais. Ele apareceu na manhã seguinte e nós acabamos no jardim com os empregados todos olhando para nós três fazendo aquelas posições estranhas. Mas depois disso eu estava fisgado (eu havia aderido ao Yoga). Tenho feito Yoga praticamente todos os dias desde então. Houve lapsos ocasionais, mas Yoga é definitivamente parte de minha vida diária agora.
Ganga White: Além dos benefícios da saúde e da boa forma, de que outra forma o Yoga afetou sua vida?
Sting: Uma das primeiras perguntas que eu tinha sobre Yoga era o fato de que me parecia tomar muito tempo para as práticas. Levava de uma hora e meia à duas horas, para fazer a coisa toda. Danny me disse algo, que na ocasião eu não acreditei, mas que está sendo confirmado. Ele disse: “Se você praticar Yoga, você terá mais energia para fazer as outras tarefas durante o dia. O tempo vai expandir para acomodar a prática do Yoga“. Quando faço Yoga pela manhã, tenho mais energia durante o dia. Consigo fazer mais coisas, minha mente está mais composta. Existem mais benefícios do que havia imaginado. Esses benefícios não são só físicos, mas também mentais, e eu começo a crer também que eles são espirituais. Quanto mais você se aprofunda no Yoga, mas você descobre que é uma prática de transformação da consciência. Mas Yoga é uma jornada que estou percorrendo. É o caminho que estou seguindo. Suponho que a medida que envelheço é que me torno mais contemplativo. A prática do Yoga vai assumindo esse aspecto. Especialmente a respiração, que está intimamente ligada à meditação.
Ganga White: Sei que você é uma pessoa que se questionava profundamente e que questionava a vida. Isto é a prática da meditação do Jñana Yoga, denominada “vichara”, questionamento. Você vê o Yoga assim? O Yoga tem lhe ajudado neste sentido?
Sting: Certamente o Yoga me introduziu a um estilo de meditação. A única meditação que eu teria feito antes seria escrever minhas músicas. Ao compor música você tem que virtualmente entrar num estado de transe para transmitir canções. Eu não acredito em escrever canções. Elas vêm através de você. É acreditar que elas existem “fora” de você e que você deve ser o transmissor. Para tanto, precisa-se uma certa pureza mental. O Yoga é apenas um caminho diferente para esse mesmo processo. Você está pegando algo do nosso eu superior e o colocando em uso na sua vida comum, eu acho. Isto faz sentido?
Ganga White: Sim. Alguns músicos que conheci acham que quando eles começam a meditar, meditação silenciosa, eles realmente ouvem música “por dentro”. Você escuta essa música interna?
Sting: Eu ouço música o tempo todo. Algumas vezes isso me deixa louco. Em absoluto silêncio, eu ouço música, ouço ritmos, ouço passarinhos cantando. Vivo num mundo auditivo. O Yoga pode induzir a este estado.
Ganga White: Você pode dizer alguma coisa sobre seus atuais desafios em relação a sua prática de Yoga?
Sting: Uma das coisas interessantes é que estou conhecendo um corpo melhor do que nunca, e reconhecendo também que certos bloqueios na minha prática são o resultado de algum tipo de problema psicológico. A história de minha vida está escrita no meu corpo, nos meus músculos. Eu sou muito “travado” (não tenho flexibilidade) nos meus quadris. Isto é algo que eu não sabia antes. Pensava que era bastante “solto”. Algumas das posições são tão extremas que elas lhe fazem ver o que você tem feito ao seu corpo. Todos aqueles anos praticando corrida devem ter cobrado sua conta. Disseram-me que rigidez nos glúteos tem a ver com teimosia, obstrução total. Estou trabalhando isso. Você sabe, a intenção, a propósito, a longo prazo, é tornar-se completamente fluido, completamente líquido e sinuoso. A medida que envelheço, gostaria de ser, de me tornar assim. Gostaria de ter explorado todas as habilidades do meu corpo. Não que eu tenha medo de envelhecer. Eu só quero envelhecer de um certo jeito, de certa maneira.
Ganga White: Graciosamente.
Sting: Eu quero envelhecer graciosamente. Eu quero ter boa postura, ser saudável e quero ser exemplo para meus filhos. Estou trabalhando nisso. Não estou pretendendo de forma alguma ser um adepto ou coisa assim, sou apenas um principiante. E realmente sinto que estou no caminho.
Ganga White: Você está praticando a série Ashtanga Vinyasa?
Sting: Acho que foi útil para mim ser apresentado a essa série logo no começo porque ela é muito militante e um tanto “macho”. Ela apelou para meu sentido de desafio. Gosto do fato dessa série ser díficil. O que não quer dizer que esta é a única prática a que fui exposto nos últimos quatro anos. Fiz outras e aprendi muito com elas. Trata-se no mínimo de uma agradável mudança e um alívio fazer outras séries, como por exemplo a série onde você deixa fluir seu próprio ritmo. Ela explora músculos e posições nunca antes feitas. Ela é ilimitada. Não parece ter fim, o que é excitante.
Ganga White: Dizem que você tem extraído satisfação dos ensinamentos esotéricos do amor e do sexo tântricos.
Sting: Quando aprendi a fazer nauli (isolar e movimentar o músculoreto abdominal) e os bandhas (um feito do qual me orgulhei muito), também li que era muito bom usar essas técnicas no sexo. Elas permitem que você controle melhor todo o processo e permitem fazer amor por mais tempo. O que acho que tem efeitos benéficos. Tem havido muita controvérsia com relação a quanto mais você pode ir, portanto não quero discutir isso agora. Já tenho problemas que chega! Mas há efetivamente efeitos benéficos para nossa vida sexual. Especialmente quando você tem um bom relacionamento com um bom parceiro.
Ganga White: Com relação a meditação, eu sei que você tem “viajado” intensamente. Você poderia falar sobre coisas que você aprendeu e coisas que você tocou na paisagem interna?
Sting: Eu fui criado como católico. Ia à igreja toda semana e recebia os sacramentos. Fui educado desta forma, mas isto nunca tocou a essência do meu ser. À medida que envelheço, vejo que me custa aceitar um universo existencial sem um Deus. Isto já não faz sentido. Eu sinto que tem que haver um nível de compaixão e compreensão maior que o meramente humano. Esse nível de compaixão e compreensão está dentro de nós. Acho que cabe a nós decodificá-lo, Deus ou como quer que você queira chamá-lo, e é melhor não dar um nome, pois está codificado em nós. Há vários métodos de decodificá-lo, e eu acho que Yoga talvez seja um deles. A música é outro, a meditação e a oração também.
Ganga White: Devo dizer que, conhecendo você, Sting, sinto estar profundamente em contato com o sagrado, com o espírito, com o manifestar amor e compaixão em sua vida.
Sting: Bem, eu estou tentando, mas nunca é suficiente, na verdade. O que estou encarando neste momento em minha vida espiritual é a imensidão desta possibilidade, que eu acho atemorizante. Estou trabalhando com esta enormidade. Não é um caminho fácil. Como o Yoga, a vida espiritual é na verdade muito díficil.
Ganga White: Você estudou os ensinamentos de Krishnamurti e o Jñana Yoga. Você pode não dizer isto, mas você foi tocado pela meditação sobre o sentido da morte. O que você aprendeu com a meditação sobre a morte?
Sting: Eu suponho que isso seja parte de se estar na meia-idade (na metade da vida). Até pouco tempo, eu realmente pensava ser imortal. Pode soar ridículo, mas a maioria dos jovens pensam que são imortais. Especialmente quando as coisas vão bem, quando você faz sucesso, quando você está feliz e tem uma porção de coisas a seu favor. Como poderia você eventualmente morrer? E a notícia ruim é que obviamente você pode morrer. E a boa notícia, por outro lado, é que você morre. Eu acho que temos que abraçar essa idéia. Temos que aceitar que morrer é tão natural quanto nascer, tão natural quanto inspirar ou expirar. É parte da vida. Algumas vezes eu luto contra isso, como todos, mas a aceitação, eu acho, é a coisa mais positiva a fazer. Isso não significa se sentir infeliz e obcecado com a idéia do próprio detrimento. Eu penso que a aceitação da morte lhe traz mais razão para viver, viver de maneira feliz, como a vida deveria ser vivida. Viver para o momento. Eu estou aprendendo isso. Repito, não falo como alguém que atingiu o “sámadhi” ou algo assim. Eu sou um aprendiz!
Ganga White: Antes de terminar, você tem alguma coisa a dizer aos yogis do mundo?
Sting: É interessante para mim ver como o Yoga está se tornando incrivelmente popular. Mais e mais pessoas estão aderindo. Eu acho que o tempo é próprio para o Yoga. Nós estamos vivendo num tempo muito complexo – um tempo de grande tumulto e mudanças. Os mais irracionais dentre nós estão preocupados com o final do milênio. Como se uma data realmente fosse importante. O Yoga é um antídoto para tudo isso. O Yoga vai nos tirar dessa paranóia histórica. É um longo caminho que não termina em 1999.
Ganga White: Eu diria que é assim se entedermos Yoga como um caminho que nos liberta do dogma e do autoritarismo, ao invés de perpetuá-lo. O Yoga não faz isso automaticamente.
Sting: Eu acho que você acaba como seu próprio professor de Yoga. Acho que você precisa começar com um professor, começar com um modelo para lhe guiar. Mas a partir de certo ponto, você é o seu próprio professor, seu próprio guru. Você precisa de ajuda de vez em quando, mas você pode praticá-lo sozinho. Há também aspectos positivo em praticar Yoga em grupo. Fiz muitas aulas em Nova York com grupos grandes de pessoas, e a energia do grupo tem sido muito útil. Acho que há lugar para ambos: a exploração pessoal e o trabalho de grupo. Trabalho com professores de quando em vez. Queria ressaltar que todos os membros da minha banda praticam Yoga. Fazemos no mínimo uma hora e meia de Yoga antes de cada concerto, o que eu penso ajuda a aumentar nossa coesão como grupo e como indivíduos. O Yoga certamente nos mantém em forma. Não é fácil estar na estrada. Não é uma ocupação das mais saudáveis. Você passa todas as noites acordado até tarde e bebe álcool. Yoga é um bom recurso para manter o equilíbrio para todos nós.
Ganga White: Em nosso círculo de meditação, na noite passada , você expressou a compreensão sobre o amor e sobre como aplicá-lo.
Sting: Eu acho que essa meditação é profunda. Quando você realmente se depara com essa enormidade da eternidade, você precisa confiar em algo que vai lhe dar sustentação para passar por esse terror, esse medo. Aprendi a confiar no poder do amor. Amor por si mesmo, pelas pessoas com quem você está, sua família, seus amigos. Amor pela simplicidade, amor pela verdade. Eu acho que sem amor nada tem sentido. Isso pode soar como óbvio. Mas é verdade. O amor conquista tudo.
Ganga White, o entrevistador, é fundador e presidente da White Lotus Foundation, professor de Yoga e autor em Santa Bárbara, Califórnia. Essa entrevista foi publicada originalmente na revista Yoga Journal, em 1999.