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O Tantra e os Yogas

1) Por que a palavra Tantra está tão relacionada a sexo e libertinagem? Por causa dos valores sexistas, hipócritas e distorcidos da nossa sociedade em relação à sexualidade. A civilização judaico-cristã é obsessionada com o sexo e incapaz de toma-lo como algo espontâneo ou natural. Uma prova clara disso é a invasão de imagens com […]

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1) Por que a palavra Tantra está tão relacionada a sexo e libertinagem?

Por causa dos valores sexistas, hipócritas e distorcidos da nossa sociedade em relação à sexualidade. A civilização judaico-cristã é obsessionada com o sexo e incapaz de toma-lo como algo espontâneo ou natural. Uma prova clara disso é a invasão de imagens com forte apelo sexual nas capas das revistas, seja para vender produtos de beleza, seja para vender carros ou o que for. Outra prova é o fato que alguns autodenominados ‘mestres’ de ‘Tantra’, ‘Yoga sexual’ ou assemelhados fazem sucesso prometendo orgasmos infindáveis e iluminação e cobrando mundos e fundos por isso.

Tantra é o nome de um vasto leque de ensinamentos práticos que têm como objetivo expandir a consciência e libertar a energia primal do ser humano, chamada kundaliní. O princípio comum a todos os caminhos práticos do Tantra é que as experiências do mundo material podem usar-se como alavanca para conquistar a iluminação, já que o este é a manifestação de uma outra realidade, sutil e superior, que está conectada com a nossa própria natureza.

Neste contexto, a visão do Tantra associada ao êxtase sexual é pateticamente superficial e parcial, se comparada com a verdadeira tradição. O Tantra não é hedonista nem orgiástico. O objetivo do Tantra é o despertar da força potencial no homem, e isso não é uma tarefa fácil nem que se possa conquistar dando prazer aos sentidos ou alimentando a sexo-dependência.

2) É correto dizermos que alguns conceitos foram distorcidos ao longo do tempo?

Não creio que essa tenha sido uma distorção temporal, mas cultural, que aconteceu aqui no Ocidente quando esses ensinamentos sagrados mudaram de contexto, embora hoje em dia haja distorção destes ensinamentos também na Índia. Ao tirar esse tipo de prática do seu contexto original para adaptá-la ao gosto ocidental, se corre o perigo de reduzir a busca da própria essência a um artigo de consumo, um “produto”. Surgem assim adaptações, versões diluídas, para tornar o produto mais palatável e, conseqüentemente, mais vendável.

3) Qual é a origem do Yoga tântrico?

O Tantra é herança e patrimônio da cultura dos rios Indo e Saraswatí, no norte do sub-continente indiano, onde nasceram igualmente o Yoga e o hinduísmo. O culto da Grande Mãe está presente na Índia desde o neolítico (8000 a.C.), mas os mesmos símbolos que o tantrismo utiliza hoje remontam ao paleolítico (20000 a.C.) e estiveram sempre presentes ao longo do continente eurasiano.

O Yoga tântrico assimilou e organizou os rituais da Deusa Mãe, transformando-os num método de emancipação que busca na psique humana a manifestação da própria força da Shaktí. Este movimento teve uma forte influência sobre a religião, a ética, a arte e a literatura indianas, havendo ressurgido com inusitada força entre 400 e 600 d.C., quando chegou a transformar-se numa moda que acabou por influenciar nos modos de pensar e agir da sociedade indiana medieval. Aqui ela se afirma, populariza e estende ainda mais, dando origem a um grande número de correntes e manifestações filosóficas, religiosas, mágicas e artísticas, algumas antagônicas.

4) Existem diferentes tipos de Yoga. Existe um melhor do que o outro?

A modalidade de Yoga escolhida por cada um de nós deve estar em função das nossas expectativas e necessidades. Diferentes formas de Yoga não dão os mesmos resultados com as mesmas pessoas e não há consenso sobre o que deveria ser ensinado em uma aula de Yoga.

Entretanto, é preciso frisar que não existe um Yoga superior, mais completo ou melhor que os demais. Se um professor de Yoga afirmar o contrário, dizendo por exemplo “o meu Yoga é o melhor do mundo”, estará se colocando numa postura que fere e ética do sistema e confessando explicitamente que não entendeu uma das partes mais importantes da filosofia, que é a necessidade de respeitar o Dharma, a justiça divina.

Cada método se adapta melhor para objetivos diferentes. O melhor Yoga é aquele que funciona para você, que satisfaz suas necessidades e preenche suas expectativas, sejam elas quais forem. É questão de procurar até achar algo que lhe satisfaça.

5) Poderia descrever brevemente os principais tipos de Yoga?

Vou dar uma lista incompleta, pois seria impossível enumerar todos os Yoga existentes neste espaço limitado. Há muitos métodos diferentes de chegar no objetivo final do Yoga, que é o estado de união consigo mesmo e com a alma cósmica.

Dos sistemas de Yoga que utilizam abordagens físicas, os métodos mais populares no nosso país são o Hatha Yoga, a Yogaterapia, o Ashtanga Vinyasa Yoga e o Iyengar Yoga.

O Hatha Yoga tradicional é sem dúvida o mais difundido e praticado, por ser o que chegou primeiro aqui, nos anos 50, dando origem inclusive a alguns tipos de Yoga que foram criados aqui mesmo no Brasil e que não possuem nenhuma conexão com as tradições filosóficas da Índia.

O Ashtanga Vinyasa Yoga, o Iyengar Yoga, a Yogaterapia e o Power Yoga chegaram muito mais recentemente, mas estão conquistando seu espaço na preferência dos brasileiros, despertando interesse em outros segmentos da sociedade que os originalmente interessados no Hatha Yoga.

Se estiver procurando uma atividade desafiante e energética, onde possa explorar e extrapolar seus limites físicos através de uma malhação consciente, o Ashtanga Vinyasa Yoga, o Iyengar Yoga ou o Power Yoga podem ser extremadamente exigentes, adequadas para atletas e pessoas que gostem de trabalhar o corpo com disciplina e intensidade.

Se for o caso de usar Yogaterapia por indicação médica, se recomendam uma ou duas sessões diárias de exercícios específicos que incluam ásana, pranayama e yoganidra, bem como aconselhamento alimentar. O professor neste caso precisa ter muito estudo e experiência no assunto. Há professores que preferem negar os efeitos terapêuticos do Yoga, o que é muito mais fácil que estudá-los.

Existem muitas outras modalidades que não trabalham o corpo, como o Mantra Yoga, que investiga os efeitos dos sons e das vibrações sutis sobre a consciência; o Bhakti Yoga ou Yoga devocional, conhecido principalmente através do movimento Hare Krishna; o Raja Yoga, que dá muita mais ênfase à prática da meditação; e outros sistemas que visam a atingir o estado de comunhão através de exercícios de auto-reflexão e discriminação, como o Jñana Yoga ou de rituais, como algumas formas ortodoxas de Tantra Yoga.

6) Na sua opinião, como a prática do Yoga vem evoluindo ao longo do tempo?

O Yoga é inerente ao ser humano e permanece sempre vivo na memória coletiva da Humanidade. Sabemos que as crianças fazem espontaneamente técnicas de Yoga, sempre como brincadeira, sempre de forma instintiva. Isto, porque ele faz parte da nossa essência. O Yoga nasce a partir da compreensão das manifestações externas da natureza e suas influências subjetivas sobre a consciência humana.

Durante o processo histórico de formação do Yoga, que durou milênios, foram acrescentando-se novas técnicas, experiências e constatações das sucessivas gerações de praticantes, que por momentos o enriquecem e refinam com novos achados mas às vezes o rebaixam quando, por exemplo, passam a incorporar a pequena magia popular.

Entretanto, por mais que mudem alguns dos seus conteúdos durante essa travessia, a essência do Yoga continua sempre a mesma: mágica, imutável e atemporal. A mensagem do primeiro praticante, atravessando as gerações, continua sendo válida para nós, homens do século XXI.

7) Quais os benefícios que o Yoga pode trazer para seus praticantes?

O Yoga pode literalmente dar uma vida nova a quem o pratica. Através das práticas físicas, adquire-se um corpo novo, mais saudável e flexível, que possibilitará ter uma vida mais longa e com mais qualidade de vida. Adquirindo a capacidade de relaxar, podemos observar o mundo com mais objetividade e sermos mais justos em todas as situações que a vida nos coloca. A prática da meditação é o martelo que destrói a ignorância real, que é a incapacidade de responder perguntas como ‘quem sou eu?’ ou ‘o que estou fazendo nesta vida?’

8) Há quanto tempo você pratica? Como o Yoga influenciou e influencia sua vida?

Pratico há 19 anos. Comecei no Uruguai quanto tinha 16 anos de idade e nunca mais parei. Desde o início percebi que a capacidade de transformação do Yoga poderia me ajudar e ajudar as pessoas a terem uma vida mais feliz e saudável. Vejo a prática mais como uma forma de vida, uma atividade que permeia as 24 horas do meu dia, do que uma série de exercícios que se fazem algumas vezes por semana dentro de uma sala fechada.

O Yoga tem a ver com estar presente em todas as experiências de vida, receptivo e atento para poder realizar o propósito supremo da existência que é desenvolver a natureza divinal no homem. Esse processo de ‘divinização’ do ser humano inclui uma visão do mundo em que o yogi enxerga o conjunto da sociedade humana como uma única família. Portanto, implica que o praticante fará alguma coisa para melhorar as condições de vida dos seus semelhantes no lugar onde ele mora. Pessoalmente, acredito que é importante reciclar o lixo humano que a sociedade descartou. Para realizar este ideal, dou aulas no presídio masculino da minha cidade, Florianópolis.

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