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Ezour: o Veda de Jesus?

Um pouco da história suja dos europeus na terra do Yoga que nunca nos contaram!

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Um pouco da história suja dos europeus na terra do Yoga que nunca nos contaram: Roberto de Nobili, aristocrata italiano e missionário da Companhia de Jesus, chegou na Índia no século XVII com o firme propósito de converter os hindus à fé de Cristo. Estabeleceu-se em Madurai, cidade que, na época, era um centro de estudos e peregrinação do hinduísmo.

Ele decidiu despir o cristianismo das roupagens ocidentais e vesti-lo ao estilo indiano, adaptando-o aos costumeis locais. Assumiu a forma de vida dos bráhmanes, adotou o vegetarianismo, raspou a cabeça e usou todos os símbolos que caracterizam o sannyásin (renunciante), inclusive o cordão sagrado, com um detalhe: levava o crucifixo pendurado nele.

Apresentava-se como um príncipe e exigia direitos e privilégios dos governantes locais. Foi dele a idéia, ainda hoje usada por missionários de todas as denominações, de comprar conversões e batismos com ouro, financiado pela Companhia de Jesus.

Este bom jesuíta é responsável por uma das maiores fraudes de que se tenha notícia na literatura mundial. Ele revelou sensacionalmente, para indianos e europeus, que havia encontrado “O Quinto Veda”.

O mais lamentável é que, antes da fraude vir à tona, ele foi considerado por Max Muller e outros indólogos como ‘o primeiro grande sanscritista europeu’ (Lectures on the Science of Language, p. 167).

A Enciclopédia Italiana (1951, (vol. XXV: 541) ensina-nos, sob o verbete “Orientalismo – Índia”, que este falso Veda, chamado Ezour, foi redigido com a ajuda de um trânsfuga bengalês, que copiou e modificou alguns hinos do Yajur Veda, de forma que os textos, deformados, passaram a condenar duramente a ‘idolatria’ e o politeísmo dos Tantras e os Puránas, como forma de facilitar a conversão dos hindus ao cristianismo.

O “Veda de Jesus”, como ficou conhecida esta obra na época, está escrito na forma de um debate entre dois rishis vêdicos, um politeísta e um monoteísta (como se fosse possível existir tal coisa!). Obviamente, como o único intuito da obra era a catequese, quem vence o debate é o monoteísta, que apresenta o “verdadeiro e pristino hinduísmo”, e suas supreendentes similitudes com a fé cristã.

Causou sensação na época, chegando a enganar o próprio Voltaire, que o definiu como “o mais precioso presente que foi dado pelo Oriente para o Ocidente” (Essay sur les Moeurs et l’Esprit des Nations, 1756). A mentira alastrou-se até o início do século XIX e só foi descoberta quando alguém percebeu que o papel em que este “shastra” havia sido escrito, tinha sido feito na Europa.

O professor José Martins Domingues, da Universidade de São Paulo, afirma que A descoberta posterior dessa contrafação levou um filósofo inglês, Dugald Stewart a sustentar que “tanto a literatura quanto a língua sânscritas não passavam de uma falsificação, feita por hábeis brâmanes, segundo o modelo grego, após a conquista de Alexandre” (A. Macdonell, “A History of Sanskrit literature” (1972, pg. 2).*

O preconceito dos missionários chegou a produzir pérolas como esta: ‘eles não podem entender que, sendo nossa religião geral e para a terra toda, a deles não pode ser senão pura fábula e invencionice.’

Roberto de Nobili, que morreu em 1656, ainda é muito querido e respeitado na Companhia de Jesus pelo seu afã missionário.


* Leia online o artigo completo do professor Martins Domingues, chamado A Introdução do Sânscrito na Europa, em www.humanas.ufpr.br/departamentos/delin/classic/ellc/SANSCR.HTM. Esse paper foi apresentado nos Encontros de Lingüística e Línguas Clássicas, na Universidade Federal do Paraná, em 3 de maio de 1996.

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Pedro nasceu no Uruguai, 58 anos atrás. Conheceu o Yoga na adolescência e pratica desde então. Aprecia o o Yoga mais como uma visão do mundo que inclui um estilo de vida, do que uma simples prática. Escreveu e traduziu 10 livros sobre Yoga, além de editar as revistas Yoga Journal e Cadernos de Yoga e o site yoga.pro.br. Para continuar seu aprendizado, visita à Índia regularmente há mais de três décadas.
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