Pratique, Yoga na Vida

Profissão: yogi

Nos primórdios dos tempos, quando os yogis transmitiam a tradição a seus estudantes, sabia-se que nada cobravam pelo ensinamento, embora recebessem uma justa retribuição

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Nos primórdios dos tempos, quando os yogis transmitiam a tradição a seus estudantes, sabia-se que nada cobravam pelo ensinamento, embora recebessem uma justa retribuição, que cada um dava de acordo com sua consciência. Reuniam-se junto à Natureza e lá estavam prontos a vivenciarem a sabedoria do Yoga, com o fito primordial de manterem a transmissão do conhecimento e o foco em moksha, a Libertação.

 

Hoje em dia, professores de Yoga neófitos que terminam um curso de formação, ao se depararem com a realidade dos fatos, vêem-se em um caminho bifurcado. Usualmente, iniciam ministrando aulas a amigos, colegas de trabalho, familiares e até mesmo em alguns espaços de Yoga, sem cobrar nada por isso. Outros, também a título de Karma Yoga, oferecem suas aulas aos mais necessitados ligados a uma instituição social. Outros, dão aulas em academias de ginástica, estúdios de Yoga e até mesmo algumas clínicas de reabilitação física recebendo um emolumento.

 

Mas, a pergunta que não quer calar é a seguinte: quanto se deve pagar ao professor de Yoga por uma aula? Quanto se deve pagar ao yogi que pratica, estuda e que teve gastos para se formar professor? Que investe em livros, workshops e cursos de aprimoramento na área, muitas vezes no exterior? Será que esse valor deveria ser equivalente ao que se paga a outros profissionais que atuam em clubes, clínicas ou academias?

 

Como é de costume em todas as carreiras, não só a de professor de Yoga, ao iniciar-se na senda do ensino da tradição milenar, alguns yogis começam ganhando um estipêndio simbólico. Um pagamento para estagiário, assim poderíamos dizer. Mas, qual é o valor monetário justo e correto a se pagar ao professor de Yoga por sua aula? 30 ou 60 reais? 75 reais ou mais do que isso?

 

Será que os estúdios e espaços de Yoga, academias e demais estabelecimentos estão pagando os professores de maneira adequada pelas aulas que oferecem em seus espaços? Você já parou para refletir sobre isso?

 

Sei de escolas que pagam muito bem, valorizando e reconhecendo o professor de Yoga e também sei de outras escolas que não pagam nada bem. É sabido que as escolas de Yoga têm despesas com pessoal de atendimento, limpeza, contador, água, luz, telefone e despesas com manutenção. Mas, não se deve desprezar a qualificação, o empenho e a dedicação do yogi que ensina.

 

Hoje em dia ouvem-se muitos comentários nos bastidores do Yoga de professores que estão insatisfeitos com o valor-retribuição a eles pagos. Talvez, até tenham levado a conhecimento hierárquico a insatisfação, mas podem até ter recebido como resposta que ‘se contente não está, a porta da rua é a serventia da casa; há tantos professores querendo trabalhar!’ Mas, o que não sabem é que igual ao profissional que trabalha em seu espaço até agora, outro igual não tem e não terá. E, esse tipo de depreciação somente trará escassez ao estabelecimento que assim pontua.

 

Por sua vez, aquelas escolas de Yoga que pagam muito bem ao professor, estão gerando mais riqueza. Riqueza e qualidade no ensino do Yoga, pois o yogi que recebe um pagamento justo por suas aulas, sente-se mais motivado a ensinar, a praticar, a estudar e a aprimorar o conhecimento. E, conseqüentemente, veste literalmente a camiseta do espaço de onde transmite a tradição.

Já aqueles estabelecimentos que pagam pouco ao dedicado professor, estão gerando escassez e negatividade em seu ambiente, ou seja, yogis insatisfeitos que só pensam em abandonar o barco em que se encontram, trocando-o por uma escola que melhor os remunere ou abrir o próprio espaço.

 

Destoante é arrecadar comercialmente volumosas quantias a título de mensalidades e não prezar e valorizar o professor de Yoga que presta o serviço. Não adianta querer continuar tapando o sol com a peneira.

 

Tome-se por base, o exemplo da mensalidade de 120 reais pagos por cada aluno praticante de Yoga em muitas cidades do nosso país, por quatro aulas mensais de 90 minutos, compondo uma turma com dez ou mais alunos. Se a classe tem 12 alunos, só esta turma perfaz R$ 1.440 ao mês. Se forem pagos R$ 25 por aula ao professor de Yoga, ele receberá somente R$ 100 no conjunto das quatro aulas, enquanto a escola ganhará R$ 1.340. Esta situação de abuso, a aplicação da mais-valia, faz lembrar bem o caso dos trabalhadores chineses, não é? Não seria isto uma afronta ao asteya (princípio da honestidade)?

 

Não é minimamente honesto pagar cinco reais por aula a um yogi, independentemente do tipo de formação que ele tenha. Isto tem que ser bem revisto. E como será mesmo que um professor de Yoga vai se sentir em ganhar apenas R$ 5 por aula? Como irá sobreviver nessas condições? Terá que pagar para trabalhar?

 

Como agravante é muito bem sabido, que alguns donos(as) de espaços de Yoga que ganham muito em cima do yogi professor nem põem a mão na massa. Isto é, nem sequer dão aulas. Em alguns casos, há um acordo entre escola e professor, sobre uma percentagem daquilo que é arrecadado nas turmas.

 

Sabemos, portanto, que não é só a parte financeira que interessa ao verdadeiro professor de Yoga, mas sim o amor pela transmissão desta nobre filosofia, permeado pelo benefício pleno trazido aos alunos-praticantes. Porém, como vivemos em um mundo no qual dependemos do fator monetário, nada mais justo do que se pagar adequadamente àqueles que merecem. Harih Om!

Humberto é professor de Yoga em Campinas. Seu email é humbertomeneghin@yahoo.com.br.

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Humberto é professor de Yoga em Campinas.
Mantém o excelente blog Yoga em Voga.

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5 respostas para “Profissão: yogi”

  1. Muito oportuno este texto.
    Eu mesmo me pergunto: Como viver somente de yoga?
    Vejam o meu caso: tenho 3 filhos.
    Vou sustentá-los apenas com aulas de yoga, e ainda, sendo um yogin honesto?
    Convenhamos, é pouco provável.
    Por isso, tenho outra profissão.
    Mas, tento praticar hatha-yoga no mínimo duas vezes por semana e meditar diariamente.
    Se as pessoas buscarem a minha ajuda em termos de yoga, tudo bem, as ajudo e nada cobro.
    O que eu acho perigoso são os professores inescrupulosos que cobram preços absurdos.
    Um abraço a todos.
    Om shanti namastê!

  2. oi colega Humberto,
    Muito apropriado seu artigo e veja, qdo estivemos juntos no último curso, em Maresias, comentei contigo sobre a versão de um “professor de Yoga”(?) q me disse, literalmente, q uma das traduções da palavra yoga era “lucro e propriedade”, se lembra?
    Em contrapartida, como vc disse, existem professores iniciantes, q não se sentindo ainda seguros no pulso, acabam por “não cobrar” por suas aulas…
    Enfim, temos q evitar esse contraste, pois ministrar práticas de yoga envolve todo um esforço de nossa parte em sermos realmente “professores”, isso é, passarmos aquilo q estudamos com afinco gastando tempo, e pq não dizer energia monetária?
    Nada contra essa energia, mas o q deve-se observar, segundo nossas convicções yóguicas, é o caminho do meio.
    É direcionar nossa profissão num sentido sincero de melhoria da vida de nossos alunos e com certeza receber a remuneração justa p/ nossa sobrevivência no planeta.
    Tem uma frase do dramaturgo Bernard Shaw: “quem sabe faz, quem não sabe, ensina, quem não sabe ensinar, ensina a ensinar, e quem não sabe ensinar a ensinar é um crítico.”
    Vamos então aprender o q ensinamos e por na prática – equanimidade é o segredo, assim nossa consciência estará tranquila e virá a paz.
    Bj e afeto
    Beth

  3. Hélio e Daniela, obrigado por seus comentários que acrescentam idéias válidas ao contexto do artigo.

  4. Grande Humberto! Bastante oportuna essa eterna questão, meu amigo.
    Sempre procurei conduzir práticas em escolas que respeitassem o Yoga e tivessem uma ideologia que combinasse com a minha: lucros justos e dedicação à função. São poucas. As últimas novidades de estratégia administrativa de algumas ditas escolas de Yoga incluem até o estímulo a uma “competição saudável” entre professores, o que realmente não entendo e não faz parte do caminho que trilho. Ao invés de ver quem tem mais aluno, dá a melhor aula ou faz o asana mais bonito, melhor seria apoiar os professores nos seus cursos de atualizações, evitar cortar todas as aulas daquele que viaja para aprimoramento, apoiar aqueles que durante meses estudaram e construíram uma prática para a classe e dar condições para cursos e reuniões de estudos. Agregar valores ao invés de estimular competição e divisão. A administração que coloca o lucro como principal objetivo da “empresa” yoga comete um erro de premissa, uma escola de yoga deve prima pela qualidade do ensino do yoga (Yamas, Niyamas etc) e pela melhoria na qualidade de vida do aluno através da prática de yoga. Além do mais o modelo de gestão contábil, caixa único com lucro DE 100% é arcaiaca, há mais de 75 anos ultrapassado, a gestão de pessoas hoje é estratégica, aproveita o melhor das capacidades individuais e coletivas, remunerando por competência e conhecimento e não por budget de área ou por metas, aí entra honestidade, satya, no pagamento e na visão e objetivo da escola. Não tenho a formula perfeita, mas porcentagem é excelente opção, mas o dono ou a administração deve se lembrar que motivação e garantia de estabilidade são fundamentais ao professor. Namastê.

  5. COMO É BOM VIVER O YOGA , APENAS PELO YOGA!… MAS QUANDO NOS TORNAMOS PROFISSIONAIS DO YOGA SURGEM VÁRIAS CONTRADIÇÕES… SUGIRO QUE, INDEPENDENTE DE COMO OU ONDE ESTIVERMOS PASSANDO ESSE ENSINAMENTO, NÃO PERCAMOS NUNCA O FOCO DENTRO DE NÓS… NÃO VALE A PENA PERDER AQUILO QUE ATRAVÉS DA PRÁTICA CONQUISTAMOS EM NÓS MESMOS ENFRENTANDO SITUAÇÕES DESSE TIPO.
    E COMO ,GRAÇAS AO YOGA VIVEMOS UMA VIDA MODESTA PODEMOS DEIXAR O BARCO COM MAIOR CALMA POR QUE PODEMOS TAMBÉM NADAR. ONDE EXISTEM DISPUTAS NÃO EXISTE YOGA.
    ENFRENTO DIFICULDADES DESDE QUE DEIXEI UM CENTRO NO QUAL SEMEEI COM AMOR ACREDITANDO QUE O JARDIM SERIA UMA COOPERATIVA , UNIÃO , HARMONIA…
    TALVEZ TENHA PERDIDO O GANHO, A OPORTUNIDADE PROFISSIONAL, MAS NÃO PERDI O YOGA!
    OM SRI MAHA LAKSMI NAMAH!

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