O silêncio é uma das práticas mais profundas que encontrei no Yoga. Para muitas pessoas, silêncio é apenas calar a boca, ou não produzir sons. Diz-se comumente “vamos fazer silêncio”, mas como fazer uma coisa que não se pode fazer?
A começar pela matéria da qual os nossos corpos são compostos, cabe lembrar que, ao nível atómico, nada pára. Se houver movimento, não pode haver silêncio. Nós não podemos achar que pelo fato de não ouvir, já encontramos o silêncio.
Se assim fosse, os surdos viveriam na bem-aventurada plenitude silenciosa. Porém, acontece que isso não é verdade: eles sentem os sons com o tato, através do corpo, e tem percepções muito sutis dos sons.
Um dia, conversando com uma amiga surdo-muda, perguntava-lhe como era estar sempre no silêncio. Achava eu que deveria ser por um lado assustador e por outro maravilhoso mas, para a minha surpresa, ela me perguntou: “que silêncio?”
Dizia que os seus pensamentos faziam tanto ruído na sua cabeça que nunca se sentia em silêncio. Apenas não ouvia os sons externos e internos do corpo como nós, mas sentia-os de outra forma, além d ter que cnviver com o barulho constante da própria mente.
Dessa situação concluí que o silêncio não é apenas a privação do som mas algo a mais. Então, será possível o silêncio na mente? Podemos fazer a experiência de colocar uma pessoa num ambiente completamente isolado do exterior durante uma hora e ver o que acontece.
Nos primeiros minutos o único som que ouve é a respiração, mas passados uns 15 a 20 minutos é possível começar a ouvir o sangue a correr nas artérias, e variando de pessoa para pessoa, ao fim de poucos minutos é possível que o ruído da sua mente seja tão alto que nem a respiração ela consiga escutar.
Então a contemplação do silêncio é mais uma questão de onde coloco o meu foco. Se direcionar a minha atenção para o exterior, considerando o corpo como exterior, encontro sempre alguma manifestação da vida e, nela, há sempre vibração, som.
Em relação à palavra escutar, na minha percepção, é que o silêncio começa a fazer sentido. Ninguém faz silêncio. O que podemos fazer é escutar/observar e não tentar atenuar ou ignorar o borbulhar constante da natureza.
O silêncio deixou de ser “feito” desde do início. Diz o Génesis que “no início era o Verbo”. O som faz parte da arquitectura do universo. Tudo é vibração: o pilar da matéria é o som.
Isso comprova-se através de experiências da física: existe uma correlação entre estruturas materiais e sons, como bem sabemos. A medicina usa-se de ultra-sons para quebrar cálculos alojados no corpo humano, por exemplo.
Na prática do Yoga, o silêncio está relacionado com a consciência de sermos a testemunha que observa, que está sempre presente por de “trás” de toda atividade. Mesmo havendo som, o silêncio serve de suporte “invisível”.
Nunca fiz uma prática prolongada de mauna, jejum verbal, mas lembro que durante um retiro de Yoga que fiz em Itália uns anos atrás, ele era observado durante o desjejum, depois da meditação matinal.
Essas refeições foram as mais preceptivas que tive na vida, o sabor do alimento era muito mais intenso. Desde aquele momento, sempre procurei estar em silêncio quando faço refeições.
Outro aspecto que tem alguma relevância para mim em relação à prática de mauna, é poder olhar para as outras pessoas e vê-las de uma forma mais real: tenho a sensação que as pessoas são mais sinceras caladas do que quando falam.
A linguagem corporal diz mais da pessoa do que ela própria possa imaginar. E não é raro que alguém habituado a falar demais, fique sem jeito, sem saber o que fazer, até gestos involuntários vem para o exterior, quando é proposto mauna.
Gosto do silêncio, por ser quase sempre revelador de mim mesmo, mesmo que as sensações não sejam boas. Para terminar, gostaria de partilhar a história dos yogis da caverna.
Há muito, muito tempo, viviam em estado profundo de meditação três yogis numa caverna dos Himalayas. Alimentando-se apenas de prana, tinham ficado em silêncio por cerca de três anos, até que certo dia surgiu um ruído na entrada da caverna.
Um mês e meio depois um dos yogis, rompendo o silêncio, disse: “Acho que passou uma vaca pela entrada da caverna”. O silêncio retornou. Dois meses depois, um segundo yogi disse: “Acho que era uma cabra”.
O silêncio reinou novamente. Seis meses depois o terceiro, interrompendo sua prática, diz: “Ou vocês dois calam imediatamente, ou eu vou embora”.
Mesmo o silêncio com tantas expressões não podemos esquecer do cilencio comtenporaneo
Anta Mauna recreativo tem sua inportancia na escola
Excelência da magnitude do cilencio na prática diária namaster
gratidão o yoga permite conhecer o nosso corpo Wagner Xavier
Parabéns pelo texto!
Mauna realmente pode ser discutido por vários prismas!
Porém a verdade absoluta deste voto, é a pratica de meditar e falar sobre Sri Krishna! Ele é a fonte Original de todos os tipos de conhecimento! Ele, Sri Krishna só Se revela aos indivíduos que NÃO O invejam! Gostei de seu texto, parabéns!
Linda colocação… Sou professora de Yoga e conduzo minhas aulas por temas… Mauna é um tema muito profundo e importantíssimo no caminho de qualquer Yogi… obrigada por suas palavras que ao me retirar do silêncio também me ajudam a estar mais perto dele! OM shanti OM!
Adorei!
Olá Mário, fiz um poema.
Silêncio – onde tudo repousa.
Silêncio – onde tudo desperta. *
Na verdade o silêncio procurado é o se despir de impulsos, correntes mentais em relação ao mundo. Isto move as palavras e conseguir por um minuto o silêncio dos impulsos humanos vale um pequeno abraço na eternidade onde se alcança a relatividade do tempo.
Lembrando que não sou nenhum yogue. São só probabilidades teóricas que experimentei no passado.
Namaste.
Sou um praticante de Ashtanga Vinyasa Yoga.
Pratico há 14 anos com frequência diária.
Oriento pessoas e observo essas questões de maneira prática e digo:
Márcio; Yes, my friend !
Relatividade. Muito bem teorizado.
Muitos pensam que mauna é apenas ficar de boca fechada. Mas esquecemos que os outros sentidos permanecem se comunicando com o mundo e a mente não se silencia.
Para quem assistiu o filme “Comer, rezar e amar”; esta passagem me lembra aquele patético exemplo de mauna, dado quando a protagonista se depara com uma das habitantes do ashram.
Nesta passagem do Mahabharata, o sábio Sanatsujata nos explica de forma breve o verdadeiro significado desta ascese.
Dhritarashtra disse: Qual o objetivo da ascese? Mauna? Eu ouvi que há dois tipos de mauna: continência da fala e meditação. Qual é superior? Poderia uma pessoa atingir este estado de quietude a se tornar livre através de mauna? Como deve ser praticado?
Sanatsujata disse: O objetivo de mauna é reconhecer aquilo que está além do alcance de palavras e da mente. O verdadeiro mauna consiste não somente na continência da fala, mas na continência absoluta de todos os sentidos e da mente. O aspecto, forma e natureza de mauna deve ser necessariamente a dissolução daquilo que é objetivo e subjetivo (dualidade) e o foco em Brahman apenas. Quando este estado é ?alcançado?, Brahman é alcançado. Brahman é representado pelo símbolo védico Om, que representa o denso, o sutil e o causal. Mauna é alcançado pela gradativa dissolução do denso no sutil, do sutil no causal e do causal em Brahman.
Mahabharata – Udyoga Parva.
Obrigado Bruno pelo seu comentário,por vezes os comentários são bem melhores que os textos, este é o caso.As palavras de Sanatsujata são bem esclarecedoras sobre o objectivo de mauna.Namaste
Difícil mesmo a prática do silêncio externo e interno. Deveríamos treinar mais em grupo, com amigos, com a família, sozinhos e aumentar nossas percepções sobre o outro e sobre nós mesmos, aprendendo a ouvir a voz do silêncio….
Ao lado dessa caverna, havia um templo e lá foi um yogui fazer retiro. As instruções do mestre foram claras: apenas duas palavras a cada 10 anos.
Passados os primeiros dez anos, o discípulo foi ter com o mestre e disse: “Comida fria”.
Mais dez anos e novo diálogo: “Cama dura”, disse o discípulo.
Mais dez anos: “Eu desisto”, desabafa o discípulo. “Eu sabia, eu sabia!!”, comenta o mestre, “todos esses anos reclamando, só podia dar nisso!!”.
Com todo o respeito, usamos essas estorinhas por que em nossa mente agitada, isso só poderia ser “piada”, não conseguimos nos imaginar realmente com votos de silêncio prolongado.
Abraços à todos.
Muito legal! Tenho pensado, experimentado, proposto sobre a Consciência Testemunha. O que diz sobre o silêncio me trás novos olhares. Se tiver algum material específico sobre Consciência Testemunha, por favor, indique.
Abraços!
A prôxima vez que me disserem: “mouna que se vai cantar o fado” já sei o que responder 🙂 Têns razão Mário: o silêncio é realmente bastante revelador.
Relativamente a expressão corporal e a movimentos involuntários,prôxima vez que fores surfar, encara todo o processo desencadeado desde o drop até ao fim da onda como uma prática de mouna.
Silêncio total dentro do barulho atômico,plena lucidez intuitiva no auge de uma acção silenciosa.O surf como disciplina espiritual é realmente alucinante,pena que a competição tenha vindo padronizar os movimentos de expressão individual,altamente reveladores de essência.
Mouna vai muito além de não escutar ou escutar o silêncio ,que alías uma prática de yoni mudra te dirá ser impossivel,a prática de mouna é a prática de ti próprio.
Dai o famoso slogan publicitário de uma famosa marca de surf,dos anos 80 ou 90 “waiting for waves is ok, most of the people spend their lifes waiting for nothing” 🙂
Muito boa a história da caverna 🙂
xee u on the line up
buddy zé.