Pratique, Yoga na Vida

Karma Yoga, a educação da vontade

O texto que você vai ler a seguir é um resumo comentado do livro Karma-Yoga, a Educação da Vontade, de Swami Vivekananda. As idéias estão expostas seguindo a mesma seqüência empregada no livro e, na sua grande maioria, apesar de reformuladas de uma maneira mais sintética, mantêm o sentido original.

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Capítulo 1 ? Karma e seus efeitos sobre o caráter

No primeiro capítulo de Karma-Yoga, A Educação da Vontade, Vivekananda conceitua Karma e explica como ele forma nossa personalidade. Segundo ele, a palavra Karma vem do sânscrito ‘kri’, fazer. Karma é ação, tudo o que fazemos. E também o efeito que essas ações têm em nós. Todas as ações são Karma, não só as boas, que nos causam prazer. Todas têm efeito em nós.

Mas isso não deveria nos afligir porque nosso propósito no mundo não é a felicidade e sim o conhecimento. Toda felicidade, todo prazer, é efêmero, acaba. Fato que não nos afasta da nossa verdadeira meta, porque o sofrimento também nos traz conhecimento. Aliás, se ao estarmos felizes não soubéssemos que estamos vivenciando o oposto do sofrimento, não conseguiríamos aprender nada com essa felicidade. Na verdade a própria felicidade não existiria sem o conhecimento do sofrimento. ‘Esse conhecimento é inato’, vem do nosso interior, está na nossa alma e brota como conseqüência de nossas ações no momento certo.

‘O conhecimento está na mente como o fogo está na pedra. É a fricção que o faz brotar.’

Ao caráter se passa o mesmo. ‘Golpes exteriores’ provocam, extraem, sentimentos de nossas mentes e esses sentimentos o moldam. É difícil controlar esses sentimentos, os efeitos da ação do mundo em nós, mas não é impossível. Vivekananda ensina que todas as ações têm o mesmo valor. Uma grande ação vale o mesmo que uma pequena. Uma grande ação vale menos que a soma de muitas pequenas, vulgares, comuns, ações. Homens como Buddha e Jesus são a prova de que o caráter não vem por hereditariedade ou educação e sim pelo resultado do Karma acumulado através das encarnações.

A lei do Karma diz que ninguém tem o que não merece e ninguém deixa de ter o que merece. Aqui ‘merecimento’ pode ser lido quase como sinônimo de ‘escolha’. ‘Merecemos’ colher o que ‘escolhemos’ plantar.

‘Somos responsáveis pelo que somos e podemos nos converter naquilo que desejamos ser. O que somos agora é resultado de nossas ações passadas.’

Se plantarmos milho, colheremos milho e assim teremos sementes de milho para novamente plantar. Se nos mantivermos inertes, este ciclo sempre se manterá. Mas, se quisermos, poderemos plantar trigo na próxima safra. É difícil romper o ciclo, nos exigirá esforço, nos demandará economia, privação, para juntar recursos para comprar sementes que não temos, estudo e dedicação para aprender os detalhes dessa nova cultura, suor para trabalhar e modificar o solo já acostumado à antiga plantação. Mas é possível. É muito mais difícil do que ficarmos como estamos, mas é possível.

Não basta agir. Temos que procurar fazer isso da melhor forma possível. Existem motivos mais ou menos nobres para a ação, mas todos são melhores que a inação. O mais elevado motivo para a ação é o altruísmo, o bem-estar alheio.

‘Amor, verdade e altruísmo não são meras figuras de retórica, são as realidades que devem constituir nosso mais elevado ideal, mesmo que seja apenas pelo poder que estas qualidades lhe conferem.’

Conter, interromper o progresso de ações geradas por motivos egoístas traz força.

É preciso equilibrar trabalho e tranqüilidade. A ação não pode se transformar num vício inconsciente. ‘Este (o governo de si mesmo) é o mais elevado ideal de Karma-Yoga, e se o tiverdes alcançado, tereis aprendido realmente o segredo da ação.’ Devemos começar pelo princípio e executar os trabalhos que nos chegam. Mas pesquisando o motivo pelo qual o fizemos. No começo acharemos que os motivos são quase sempre egoístas e que estamos preocupados em nos beneficiarmos (mesmo que com o fruto de ações elevadas) a nós mesmos, mas gradualmente esse motivo desaparece e resta o verdadeiro altruísmo. Então, ‘todos nossos poderes se concentrarão e o (auto-) conhecimento que já é nosso se manifestará.’

Capítulo 2 ? Cada um é grande em seu próprio meio

Varnas é a palavra sânscrita para o que chamamos de castas. A cultura hindu considera quatro classes sociais ? Brahmanes (sábios; líderes espirituais ou intelectuais), Kshatriyas (guerreiros; líderes sociais), Vaishyas (comerciantes; todos os que vivem do fruto de seu trabalho material direto e do trabalho de outros) e Shudras (servos; todos os que vivem do que recebem em troca do serviço que prestam a outros) ? e as vê como a diversidade na manifestação da unidade. Ser, por exemplo, Brahmane não é, a princípio, melhor que ser servo. O Karma-Yoga diz que ‘cada um é grande no seu próprio meio’. Ou seja, ter uma determinada natureza, que lhe encaixa num determinado varna, não é obstáculo nem vantagem no sadhana.

Vivekananda inicia o capítulo explicando a teoria dos gunas e afirma que Karma-Yoga é a arte de dominá-los. A moral e os deveres são relativos e variam de acordo com o tempo, o local e a classe social. O importante é buscar atitudes sattwicas dentro das condições em que nos encontramos. Mesmo o ideal máximo da não-resistência ao mal, o ‘dar a outra face’, nem sempre é uma atitude sattwica. Krishna vê hipocrisia na atitude ‘pacífica’ de Arjuna, quando este se recusa a lutar em Kurukshetra, pois, como guerreiro, seu dever (sattwico) era lutar e ele mentia ao dizer que não conseguiria fazer isso por amor aos seus inimigos quando, na verdade, estava temendo o exército adversário, muito mais poderoso. A renúncia à ação só é realmente sattwica quando podemos prever com o máximo de certeza seu resultado. Renunciar à ação por covardia é uma atitude tamásica.

‘Karma-yogue é o homem que compreende que o mais elevado ideal é a não-resistência (renúncia), e além disso que esta não-resistência é a mais alta manifestação de poder, quando realmente se possui; e também que a resistência ao mal é um passo no caminho para alcançar o poder da não-resistência. Enquanto não se tiver alcançado este ideal, o dever do homem é resistir ao mal; deve trabalhar, deve lutar e deve resistir ao mal com toda a força de que seja capaz. Só então, quando tiver obtido o poder de resistir, será uma virtude a não-resistência.’

Em resumo, a não-resistência deve ser uma atitude sincera e não uma desculpa para a covardia ou fundamentada na busca de ostentação de uma aparência elevada.

O mesmo se dá com qualquer outro tipo de ação em nossas vidas.

‘A inatividade deveria ser evitada por todos os meios. Atividade é sinônimo de resistência. Resista a todos os males mentais e físicos, e quando o tiverdes conseguido, virá a calma.’

‘Cada homem deveria fixar seu próprio ideal e esforçar-se em realiza-lo.’

O texto segue com citações do Maha-nirvana Tantra em relação aos deveres específicos ao ‘chefe de família’ (talvez tenha sido o tradutor que tenha optado por utilizar esse termo, mas, claramente, aqui Vivekananda se refere ao varna Vaishya, ou ‘comerciantes’), para demonstrar que deveres mais ‘materiais’ não são mais fáceis nem menos importantes do que os das pessoas cuja natureza exige o cumprimento de deveres mais ‘espirituais’. Alguns deles:

‘O dever do chefe de família é ganhar o sustento para ele e os seus.’

‘É seu dever auxiliar as pessoas da mesma povoação, os pobres e todos os necessitados de ajuda.’

‘O chefe de família que não se esforça para conseguir fortuna é desconsiderado porque dele dependem centenas de pessoas.’

‘Nestes casos não é censurável buscar riqueza porque é para distribuí-la.’

‘O chefe de família, fazendo lagos, plantando árvores à beira dos caminhos, construindo logradouros e abrigos para homens e animais, abrindo estradas e construindo pontes, alcança a mesma meta que o maior dos yogues.’

O capítulo termina com um conto que ilustra seu título:

Um rei pede para um sanyasin (renunciante) provar sua afirmação de que tanto o sanyasin quanto o chefe de família têm o mesmo valor. O sanyasin leva o rei a outro reino, onde a princesa, linda e riquíssima, escolhe outro sanyasin como esposo. Esse sanyasin, mesmo frente a tantas tentações, resiste e se mantém renunciante. A princesa segue seu pretendido por uma floresta e o rei e seu amigo sanyasin vão atrás dela. Ela se perde e os dois a ajudam. Eles precisam passar a noite sob uma árvore onde vive um passarinho que, vendo que seus ‘hóspedes’ estão com frio, como é dever de um chefe de família, se preocupa com seu bem estar e consegue fogo para eles. Depois, ao ver que eles têm fome, se joga ao fogo para ser comido. Um a um, os outros membros de sua família fazem o mesmo. O conto mostra que os deveres de cada indivíduo variam e o realmente importante é que eles sejam cumpridos até as últimas conseqüências. No trecho final do conto, o sanyasin diz ao rei:

‘Se quiserdes ser um chefe de família, fazei com que vossa vida seja um sacrifício pelos demais. Se escolherdes a vida da renúncia, não olheis a beleza, nem o dinheiro, nem o poder. Cada um é grande em seu próprio meio; porém o dever de um não é o dever do outro.’

Capítulo 3 ? O segredo do trabalho

Como agir. Esse é, agora, o ponto. No capítulo 4, seguinte a este, Vivekananda louva o amor de mãe como algo que coloca a mulher na posição ‘mais elevada do mundo’. Esse ensinamento resume o terceiro capítulo também.

Para quem tem um filho é mais fácil entender como agir. ‘Basta’ (como se fosse fácil) amar a humanidade como amamos nosso próprio filho e agir com ela como agimos com ele:
· Assim como fazemos com nossos filhos, devemos ajudar aos outros sempre que pudermos, pelo maior tempo possível, com a maior intensidade que conseguirmos.
· Assim como para nossos filhos, devemos dar ao próximo auxílio material se ele precisar e nos for possível. Mas todo pai sabe que uma boa educação, que o conhecimento, é um legado mais importante que o conforto material. Da mesma forma, qualquer pai irá concordar que ainda mais importante que o conhecimento é a felicidade do filho. E felicidade se ‘dá’ através da transmissão de conhecimento espiritual. É dessa forma que devemos agir em relação à humanidade. Devemos, em ordem crescente de importância, nos esforçar ao máximo para espalhar pelo mundo auxílio material, intelectual e espiritual.
· Assim como seria para nossos filhos, mais auxílio do que o próximo realmente precisa é, para ele, prejudicial. Nas palavras do gênio sertanejo Luiz Gonzaga, ‘Seu Doto, uma esmola para um homem que é são, ou lhe mata de vergonha, ou vicia o cidadão.’
· Assim como fazemos quando damos o máximo de nós para nossos filhos, ao ajudar o próximo não devemos esperar recompensa, nem mesmo gratidão. Não esperamos que nossos filhos agradeçam pela comida que botamos à mesa, pois fazer isso é nossa obrigação.

Essa ação desapegada é o principal caminho para a iluminação através do Karma-Yoga. Com ela deixa-se de produzir Samskaras, condicionamentos na mente. Então nos colocamos num plano acima do alcance do Karma. Se Karma é o efeito das ações, quando agimos sem apego ao resultado, desligados desse efeito, o superamos. Quando as ações neste mundo e seus resultados não nos importam, sobra em nós o eterno. Para esse fim, o caminho é substituir os Samskaras negativos por positivos, depois, claro, de aprender a identificá-los. Uma boa ferramenta para isso é Antar Mouna, a purgação mental, uma técnica de meditação. Então, depois de moldar a mente e o caráter com condicionamentos positivos, é hora de se descondicionar totalmente, dar liberdade à alma. Essa é a ‘meta de todos os Yogas’. Primeiro, passamos a praticar apenas boas ações, depois, deixamos de dar valor a elas, já que são apenas nossa natureza, nosso dever. Mesmo ações boas agitam nossa mente com os Samskaras que produzem e, como sabemos, Yoga é ‘Citta vrtti niroddah’.

‘Agi constantemente, porém não permitais que uma só onda domine vossa mente. Trabalhai como se fôsseis estrangeiros aqui na Terra; trabalhai incessantemente, porém não vos ligueis a ação; ligar-se é algo terrível.’

‘O ponto capital deste ensinamento é que devemos agir como ‘senhores’ e não como ‘escravos’. Não vedes como todos trabalham? Ninguém pode estar em absoluto repouso. 99% dos homens trabalham como escravos e o resultado é a miséria; todos trabalham egoisticamente. Trabalhai por liberdade. Trabalhai por amor. A palavra amor é difícil de ser compreendida. O amor não existe, enquanto não existir liberdade. Não há possibilidade do verdadeiro amor no escravo. Se conquistais um escravo e o fazeis trabalhar em vosso proveito, ele cumprirá seu ganha-pão, porém não haverá amor nele. Do mesmo modo, quando nós trabalhamos para as coisas do mundo como escravos, não pode haver amor em nós, e o nosso trabalho não é um verdadeiro trabalho.’

O Brahman, o ‘Um-sem-segundo’, se manifesta em três aspectos, Sat-Chit-Ananda (existência-conhecimento-felicidade). Os três estão intrinsecamente ligados. Brahman é existência absoluta, sempre existiu, nunca nasceu, não é afetado pelo tempo. É conhecimento, pois só ‘É’ quando sabe que ‘É’, é por se conhecer que existe. É felicidade porque é completo. Quando nos damos conta que esta nossa existência não é absoluta e sim relativa ao Brahman, que este mundo é insignificante frente ao todo, agimos apenas por amor. Não há porque agir por outro motivo. Então nos unimos ao Brahman e nos tornamos Sat-Chit-Ananda. Citando a Krishna, na Bhagavad Gita: ‘Contempla-me, Arjuna, se eu deixasse de agir um só instante, o Universo todo desapareceria. Nada tenho a ganhar na ação; sou o Senhor único. Por que atuo então? Porque amo o mundo.’

É esse o ponto. É esse desapego que deve guiar nossas ações. Assim nos livramos do Karma.

Outro ensinamento importante deste capítulo:

‘Há outra maneira de levar à prática a misericórdia e a caridade altruísta: é considerar as obras como ‘adoração’ (quando cremos num deus pessoal). Deste modo abandonamos o fruto de nossas ações ao Senhor; e adorando assim, não temos o direito de esperar nenhuma gratidão pelas obras que fazemos.’

Vivekananda encerra o capítulo ilustrando esse ideal com um trecho do Mahabharata:
Depois da batalha de Kurukshetra, os Pandavas realizaram o maior sacrifício que já se viu, dando grande quantidade de jóias e dinheiro aos pobres. Após a cerimônia, apareceu um rato com a metade do corpo dourada e começou a se esfregar no chão. Então ele disse: ‘Isso não é sacrifício!’. Aos que se espantaram com a declaração que desdenhava de um sacrifício tão opulento, ele contou a história da família muito pobre de um brâmane que passava grande necessidade, devido aos três anos de seca em sua aldeia. Depois de muito tempo, o pai conseguiu uma maçã e um pouco de farinha de cevada e dividiu entre todos. Quando iam comer, bate à porta da casa um visitante faminto. Um a um os membros da família foram dando sua porção de comida para aplacar a fome do hóspede. Logo que este foi embora, todos morreram de fome. Entretanto, alguns grãos da farinha haviam caído no chão e, ao se esfregar neles, o ratinho ficou com metade do corpo dourada. Ele diz que desde então anda pelo mundo procurando um verdadeiro sacrifício para dourar a outra metade.

Capítulo 4 ? O que é o dever

O dever é relativo. O que devemos fazer varia de acordo com o local, classe social, época, sexo, etc., em que nascemos.

‘O Bhagavad-Gita alude freqüentemente aos deveres que dependem do nascimento e da posição social. O nascimento, a posição na vida e na sociedade determinam, em grande parte, a atitude moral e mental dos indivíduos e as suas diversas atividades na vida.’

A conclusão de Vivekananda é importante:

‘Portanto, nosso dever é praticar a ação que nos exalte e enobreça de acordo com as atividades e idéias da sociedade na qual nascemos.’

Ele alerta também que devemos ter sempre em mente essa relatividade do dever ao julgarmos as ações dos outros, pois ‘a ignorância deste preceito é a causa principal dos ódios entre nações.’ … ‘devo acomodar-me ao mundo e não ele a mim.’

Acharmos nossos afazeres pequenos demais para nós é bobagem, pois
‘quando trabalhamos com entusiasmo, a natureza nos recompensa de toda a forma e logo nos coloca na posição apropriada’.
É a Lei do Karma, ninguém colhe menos do que semeou.

‘… a obra realizada com um dever é a que nos faz atuar independentemente da idéia de dever. Quando a obra se converte em culto, a realizamos por amor a ela mesma.’

Amando nossa obra, nosso Dharma, sem nos preocuparmos com seus frutos, evoluímos, pois economizamos a energia que gastaríamos nos preocupando com questiúnculas materiais e a redirecionamos para questões superiores da alma.

Acordar às três horas da manhã para preparar uma mamadeira não é agradável, mas ainda assim o fazemos com dedicação e até alegria, pois o fazemos por amor e sem nos preocuparmos com recompensa. Nosso Dharma é alimentar nosso filho sempre que ele estiver com fome, não importa a hora, e cumprimos esse dever com satisfação, pelo simples motivo de que é o que devemos fazer, sem questionamentos. É assim que devemos tratar nosso dever com a sociedade.

‘A única maneira do homem progredir é cumprir os deveres com os mais próximos e deste modo ir acumulando forças para poder ir mais alto.’ Não cumprir nosso dever, nosso Dharma, consome uma enorme quantidade de energia, gasta em remorsos, mentiras, vergonha de si mesmo, insatisfação, arrependimento, culpa…

Mais uma vez, Vivekananda finaliza o capítulo com um conto:

Depois de três anos de isolamento e privações, praticando Yoga num bosque, um sannyasin estava sentado sob uma árvore, quando uma gralha e um corvo derrubaram folhas sobre sua cabeça. Ele os olhou com raiva e seu simples olhar os fulminou. O sannyasin ficou feliz por ter desenvolvido esse poder. Depois de um tempo, foi à cidade mendigar pão e bateu à porta de uma senhora que o fez esperar. Com raiva ele pensou: ‘Desgraçada mulher, como vos atreveis a me fazer esperar? Ainda não conheceis meu poder.’ Então ouviu a mulher dizer: ‘Menino, não vos envaideçais tanto, pois aqui não há corvos nem gralhas.’ Ele ficou assombrado, mas ela explicou que nunca praticou Yoga, mas também adquiriu poderes pelo fato de sempre ter cumprido seu Dharma, inclusive o tinha feito esperar por isso, pois tinha que atender o marido doente. Então disse que se quisesse aprender mais, devia ir à cidade, falar com um vyadha (açougueiro). Ele estranhou mas foi. O vyadha também o fez esperar terminar suas obrigações no trabalho e com seus pais idosos e então perguntou ao sannyasin em que lhe poderia ajudar. O rapaz lhe fez perguntas sobre a alma e Deus e recebeu como resposta, para ler, o Vyadha-Gita, um capítulo do Mahabharata, ‘que contém um dos mais belos ensinamentos do Vedanta’. O sannyasin se espantou e perguntou como alguém tão sábio podia cumprir deveres tão baixos. Recebeu como resposta que não existe Dharma ruim e que, se cumpridos com dedicação, todos levam à iluminação.

Capítulo 5 ? Não é ao mundo que ajudamos, e sim a nós mesmos

Vivekananda inicia este quinto capítulo explicando que toda religião é composta de três partes: filosofia, mitologia e ritual. Elas vão, gradualmente, de um caráter mais abstrato a um mais concreto. A filosofia são as idéias e fundamentos, a mitologia explica essas idéias através de exemplos e o ritual as traz ao cotidiano do religioso. O ritual é um conjunto de símbolos indispensável para a compreensão dessas idéias.

Então ele desenvolve uma teoria criacionista da semiótica. Sugere que, como existem símbolos compartilhados por diversas civilizações perfeitamente isoladas entre si no tempo e no espaço, esses símbolos só podem ter surgido de forma independente da vontade ou convenção humanas. Daí o caráter sagrado e obrigatório dos rituais: os símbolos que eles encerram foram criados por uma força maior que a vontade do homem. ‘Em certo sentido, não pensamos a não ser por meio de símbolos; acaso não são as palavras símbolos do pensamento?’ E continua com uma bela frase: ‘E ainda podemos dizer que o próprio Universo é um símbolo que oculta Deus.’

Ainda sobre símbolos coincidentes em várias civilizações, afirma: ‘O que demonstra isso? Que estes símbolos não podem ser meros sinais convencionais; deve existir alguma associação mental entre eles e a mente humana.’

Vivekananda coloca essas idéias para demonstrar a importância da prática dos rituais religiosos (sempre baseados em símbolos) em nossa trajetória espiritual.

A palavra é o mais poderoso entre todos os símbolos. Demonstrando isso, Vivekananda afirma:
‘Conhecer a natureza dessa força e utilizá-la corretamente também é uma parte do Karma-Yoga.’

Então entramos mais especificamente no assunto exposto no título do capítulo, ‘Não é ao mundo que ajudamos e sim a nós mesmos.’ Vivekananda ensina que a aspiração de ajudar os outros para fazer bem ao mundo é uma ilusão, pois o mundo não precisa da nossa ajuda. Devemos, sim, ajudar aos outros para fazer bem a nós mesmos.

‘… precisamos praticar o bem; o desejo de fazer o bem é o que de mais elevado podemos aspirar, desde que aceitemos o princípio de que é um grande privilégio ajudar os outros.’

‘Abandonemos esta conversa inútil de querer fazer bem ao mundo; ele não precisa do vosso auxílio nem do meu; no entanto, devemos fazer o bem constantemente, porque isto constitui uma benção para nós. Esta é a única maneira de chegarmos a ser perfeitos.’

Querer mudar, mesmo que para melhor, o mundo, pode levar ao fanatismo, já que esse ‘melhor’ é relativo.
‘Não tendes necessidade de vos atormentar nem de perder o sono por causa do mundo; seguirá o seu caminho sem vós.’

‘Em síntese, os principais pontos deste capítulo são: primeiro, recordar que somos devedores do mundo e que este nada nos deve. É um grande privilégio para nós ser-nos permitido fazer algo pelo mundo. Ao ajudá-lo, em realidade nos ajudamos a nós mesmos. Segundo, que há um Deus neste universo. Não é certo que este universo flutue sem destino e tenha necessidade do vosso auxílio ou do meu. Deus está sempre presente nele. É imortal, eternamente ativo e infinitamente vigilante. Quando todo o universo dorme, ele permanece velando; age incessantemente; as mudanças e manifestações do mundo são obra sua. Terceiro, não devemos odiar ninguém. Este mundo continuará sempre sendo uma mistura de bem e de mal.

‘Nosso dever é simpatizar com os débeis e amar, inclusive, os malfeitores. O mundo é um grande ginásio moral, onde devemos exercitar-nos para ser cada dia mais fortes espiritualmente. Quarto, não devemos ser fanáticos, porque o fanatismo é oposto ao amor. Ouvireis continuamente que os fanáticos dizem: ‘Eu não odeio o pecador e sim o pecado’; porém estou disposto a ir a qualquer parte, por longe que seja, para encontrar o homem realmente capaz de distinguir entre o pecado e o pecador. É muito fácil dizer. Se pudéssemos distinguir bem entre qualidade e substância, poderíamos chegar a ser perfeitos. Não é fácil fazê-lo. E quanto mais tranqüilos formos e menos alterados estiverem os nossos nervos, mais amaremos e melhor agiremos.’

Capítulo 6 ? Desapego e abnegação completos

A força de nossas ações se intensifica com o passar do tempo, pois a ação realizada por uma pessoa reverbera na mente de outras. Ao entrar em contato com a energia de nossas boas ações, uma pessoa que tem tendência a praticar boas ações tem essa tendência reforçada, abalizada. Com nossas más ações se passa o mesmo. Nosso Karma influencia o Karma dos outros. Quando um torcedor começa a cantar o nome do time, logo o estádio todo estará cantando da mesma forma; o canto se espalha numa onda de intensidade cada vez maior, pois a progressão do número de torcedores cantando, e assim influenciando o do lado a cantar, é geométrica. A influência de nossas boas e más ações progride dessa mesma maneira. Além disso, essa onda é inexorável:

‘De acordo com a Karma-Yoga, a ação realizada não pode ser destruída enquanto não tiver dado seus frutos; ninguém pode impedir seus resultados.’

‘A causa deve ter seu efeito, nada a pode impedir ou minorar.’.

Entretanto, há um problema: não existe ação totalmente boa nem totalmente má, toda ação traz consigo aspectos bons e maus, dependendo do ponto de vista. ‘Disto se deduz que a perfeição jamais será alcançada pela ação.’ Mas, ‘Qual é o fim da ação?’ ‘A maior parte das pessoas crê que chegará uma época em que o mundo será perfeito’, sem doenças, desgraças, luta. Mas isso é uma contradição. A essência da vida é a luta. ‘A vida é uma luta contínua entre nós mesmos e o exterior. Continuamente nos encontramos lutando com a natureza externa e, se somos vencidos, nossa vida sucumbe.’ Se essa luta acabar, mesmo que seja com a nossa vitória, a vida acaba junto. Então, a felicidade não está no fim da luta e sim em lutar do lado certo.

‘Ajudando o mundo, ajudamos a nós mesmos. O efeito principal de nossa ação em benefício alheio é ela purificar-nos a nós mesmos; este esquecimento do eu é a grande lição que nos falta aprender.’

‘O ideal mais elevado é a eterna e total abnegação: esquecer o ‘eu’ para não pensar mais que no ‘tu’.’

Pravritti é receber, nivritti é dar, quando o nivritti é mais forte se chega à perfeição do Karma-Yoga e se atinge o mesmo ponto que o melhor dos Bhaktas ou Jnanis: a abnegação.

Se não podemos fazer o bem sem com isso gerar também algum mal, devemos então nos abster, simplesmente, de agir? Vivekananda afirma que essa resposta Krishna nos dá no Gita. ‘É a teoria de não se ligar, de não apegar-se a nada. Mesmo cumprindo-se o dever na vida.’ Recebemos o Karma, bom ou ruim, de toda ação que realizamos em nosso próprio benefício, isto é, visando algum resultado. Mas se agimos com abnegação, se agimos para os outros, para o benefício da humanidade, a quem nos doamos como se doa-se a um filho, e mais, se agimos sabendo que o resultado dessa ação escapa do nosso controle e que nem mesmo haveria sentido em controlá-lo, já que ele pertence ao universo, ao Brahman, a quem não cabe o mal ou o bem pois tudo é absoluto e esses conceitos são relativos, se, portanto, é assim que agimos, o efeito dessa ação, seu Karma, não nos atinge e tornamo-nos livres.

‘Mesmo que ele mate todo o universo e a si mesmo, não é o matador nem o morto, quando sabe que ele não age por si mesmo de nenhuma maneira.’

‘Não abandones o mundo; vive nele, assimila suas influências de toda forma que puderes, porém se tiver que ser em proveito de teu gozo próprio, não atues de maneira alguma.’

O destino do homem não é o prazer, é o conhecimento. ‘Primeiro mata teu eu e em seguida considera todo mundo como se fosses tu mesmo.’ É um erro achar que o mundo foi feito para que dele desfrutemos. ‘Se é para nós que o mundo foi criado, nós, reciprocamente, fomos criados para ele.’ ‘O mundo é para nós o que nós somos para ele.’

O agir correto é o agir sem apego. ‘Para agir com retidão, temos que abandonar primeiramente a idéia de apego. Em segundo lugar, não devemos interferir nos acontecimentos, e sim, manter-nos em posição de testemunhas e continuar trabalhando.’

Vivekananda diz que Ramakrishna lhe aconselhava a considerar os próprios filhos como o faz a ama, que os trata com o maior carinho e dedicação, mas, quando é despedida, simplesmente vai embora sem apego. ‘Assim deveis ser vós com tudo quanto considerais como vosso. Sois a ama, e se credes em Deus, crede também que todas estas coisas que considerais vossas são realmente suas (Dele).’

Vivekananda afirma que até o apego ao resultado de nossas boas ações é daninho, pois ‘É um erro pensar que alguém dependa de mim ou que possa realizar o bem a outrem.’ ‘Todos somos ajudados pela natureza, e mesmo que faltassem milhões de nós, tudo correria da mesma forma.’ ‘Tirai de vossa mente a idéia de que tendes de fazer algo pelo mundo, pois ele não precisa de vosso auxílio.’ Quando ajudamos alguém, não temos nenhum mérito, pois não fazemos isso por uma questão de ‘vontade’ e sim porque nosso Karma e o do ajudado nos trouxeram essa situação. ‘Quando tiverdes compreendido que o mundo não depende de vós nem de ninguém, vossa ação já não produzirá uma reação dolorosa. Quando derdes algo a um homem e não esperardes nada dele, nem mesmo a gratidão, sua ingratidão em nada vos afetará.’ E nem mesmo temos o direito de esperar essa gratidão, pois nada damos ou fazemos, somos
‘apenas o depositário do dinheiro ou dos bens que vos foram confiados, e o mundo os exige por seu próprio Karma.’

‘É coisa difícil, porém, com o tempo chegareis a compreender que nada no universo tem poder sobre vós, a menos que o permitais.’

‘Os Yogas não se contradizem; cada um deles nos conduz ao mesmo fim e nos torna perfeitos; só que devem ser rigorosamente praticados. Todo o segredo se encontra na prática. Primeiro deveis ouvir, em seguida pensar e depois agir.’

Depois que todas essas coisas ‘se nos apresentam claras por nosso próprio poder de percepção e pensamento, as realizaremos em nossa própria alma; e esta realização, ao desenvolver-se, se converterá num imenso poder de vontade. Primeiro temos o sentimento, depois o querer e por último a vontade (essa tremenda força que correrá em cada veia, nervo e músculo, até que todo o conjunto de vosso corpo se transforme num instrumento de altruísta Yoga de ação).’

Capítulo 7 ? Liberdade

Estudamos até agora a ‘Lei do Karma’ focados, principalmente, na segunda parte das duas que formam esta expressão, a palavra ‘Karma’. Fixaremos nossa atenção agora na palavra ‘Lei’. Refletir sobre esse conceito é de grande valia para o avanço no sadhana do Karma-Yoga.

Uma Lei é algo que se espera que ocorra. É um conjunto de fatos aos quais podemos atribuir uma seqüência lógica, previsível. Uma sociedade, baseada nos seus valores, convenciona suas leis e, para estar ‘dentro da lei’, todos precisam cumpri-las. Da mesma forma, as leis da natureza são conjuntos de fenômenos que identificamos como formadores de uma seqüência.

‘Os antigos lógicos e filósofos da escola Nyaya denominavam esta lei (essa seqüência lógica) de Vyapti. Segundo eles, nosso conceito de lei se deve à associação. Uma série de fenômenos está em nossa mente, associada a certas coisas, segundo uma ordem invariável.’ Ou seja, a lei não está nas coisas, está na nossa mente; é ela que identifica (ou cria) Vyapti, a seqüência lógica.

Entretanto, toda lei depende de uma série de condições para ter valor. Se o país vizinho cria uma lei e eu a descumpro aqui, não serei punido, pois a aplicação da pena depende da condição da lei ter sido desobedecida dentro de determinada área geográfica e, fora dela a lei ‘não vale’, é incapaz de determinar o comportamento esperável. Com a Lei do Karma se dá o mesmo. Ela é inexorável, invariável, implacável… dentro de certas condições. A Lei do Karma só ‘vale’ neste universo delimitado pela nossa mente, percebido pelos nossos sentidos, moldado no espaço e no tempo. Toda ação só pode ser praticada num espaço, todo efeito depende do tempo para surgir. A Lei de Causa e Efeito depende da condição de que o tempo coloque esses dois fatores nesta ordem.

‘Nosso universo é a porção de existência caracterizada pelo que os psicólogos sânscritos chamam Desakálanimita, ou seja, o que a psicologia européia chama Espaço, Tempo e Causação. O universo (este, delimitado por nossa mente) é apenas parte da existência infinita, posta num molde particular composto de tempo, espaço e causação. Do que se deduz que a lei (Vyapti) é somente possível dentro deste universo condicionado, não podendo existir lei alguma fora dele.’

Ou seja, a liberdade está em saber que somos apenas uma parte do ser infinito se manifestando neste pedacinho do Todo moldado pelo espaço e pelo tempo que nossa mente percebe. Viemos da liberdade, do Todo sem espaço nem tempo – e portanto sem Karma – nos sujeitamos a este universo que nossa mente cria e nosso destino é voltar à liberdade.

‘O universo é somente uma partícula da infinita existência, e todas nossas leis e limitações, nossas alegrias, nossas felicidades e nossas esperanças, estão dentro dele; todo nosso progresso e nossa decadência se acham nos limites de sua pequena jurisdição. De maneira que vedes quão infantil é esperar uma continuação deste universo (criação de nossa mente) e aguardar um céu que, depois de tudo, seja apenas uma repetição deste mundo que conhecemos. Como vedes, é um desejo impossível e infantil adaptar a totalidade da existência infinita a esta existência limitada e condicionada que conhecemos.’

‘Este homem (o que espera esse céu) é tão só o que são suas mesquinhas circunstâncias atuais. Esqueceu sua natureza infinita, e seu pensamento se circunscreve às pequenas alegrias, tristezas e aborrecimentos do momento. Pensa que esta coisa finita é o infinito; e não somente isto, mas não quer abandonar tão ridícula idéia. Aferra-se desesperadamente a Trishná, a sede de viver (…) Podem existir milhões de classes de felicidades, de seres, de leis, de progresso e de causação atuando fora deste pequeno universo que conhecemos, pois a totalidade de tudo isto compreeende apenas uma seção de nossa natureza. Para alcançar a liberdade, devemos transcender os limites do nosso universo. O perfeito equilíbrio, ou o que os cristãos chamam a paz, que se encontra além de todo entendimento, não pode ser conquistado neste mundo, nem no céu, nem em lugar algum onde nossa mente possa pensar, os sentidos perceber e a imaginação conceber. Nenhum destes lugares pode nos dar a liberdade, porque todos eles estariam dentro de nosso universo e este está limitado pelo tempo, espaço e causação.’

‘Enquanto não abandonarmos a sede de viver, a atração pela existência transitória e condicionada, não teremos nem sequer a esperança de vislumbrar essa infinita liberdade que existe além do limitado.’

‘A verdadeira religião começa onde termina nosso universo.’

‘Se renunciarmos ao nosso apego por este pequeno universo dos sentidos e da mente, seremos imediatamente livres.’

Existem dois caminhos para fazer isso: o negativo, neti, neti (‘isto não’, ‘isto não’), do Jñana-Yoga, mais difícil, onde pelo estudo e raciocínio se conhece a verdade e então, automaticamente se abdica do mundo, e o positivo ‘iti’ (isto), do Karma-Yoga, onde agindo sem cessar se experimenta as coisas do mundo e então se verifica que elas não têm valor. Os que não são capazes de simplesmente não agir, abdicar do mundo, encontram no Karma-Yoga uma ciência dessa ação, uma maneira de transformá-la num caminho para a liberdade. Karma-Yoga diz que ‘o Eu e o Meu são a causa de toda dor. Com o desejo de posse surge o egoísmo, e com ele a miséria. Cada ato, cada pensamento egoísta, nos liga a alguma coisa (deste mundo), e imediatamente nos convertemos em seus escravos.’ Nem a casa que construímos, nem o filho que geramos, nem o corpo que habitamos, nada é nossa posse, pois nada disso podemos carregar para o ilimitado. Sabendo disso ao agir, agiremos sem apego ao fruto das ação. E esse é o agir correto. ‘O não ligar-se a coisa alguma é a base de todos os Yogas.’

Vivekananda diz que existem dois métodos de atingir esse agir sem apego. Os ateus precisam usar o discernimento, a reflexão sobre estas coisas e se convencerem de que não devem agir ligados. Para os crentes é mais fácil, abandonam os frutos da ação ao Senhor, agem para ele.

Acho que ainda pode existir um terceiro time, o dos que vêem na humanidade o divino e trabalham para ela, entregando a ela seus frutos com a mesma convicção que o crente os dá ao seu Deus.

Karma-Yoga ensina ainda que, embora devamos cumprir nossos deveres com o mundo, eles estão num plano inferior. Não devemos permitir que eles conduzam nossa vida e, muito menos, que nos tornemos escravos deles, como fazem muitos que ‘vivem para trabalhar’.

‘Quando as ligações se tornam crônicas, as batizamos com o pomposo nome de dever.’

‘Não há dever para vós nem para mim. Tudo o que derdes ao mundo, daí-o de coração, mas não como um dever. Nem sequer penseis nisso. Não vos obrigueis. Além disso, por que haveríeis de vos obrigar? Tudo quanto fizerdes a título de obrigação servirá para atar-vos. Por que deveis ter deveres? Cedei tudo a Deus.’

Capítulo 8 ? O ideal de Karma-Yoga

O último capítulo faz uma síntese do livro. Diz que a meta de todos os Yogas é a liberdade e que para chegar a ela qualquer um dos três caminhos ? ação, devoção ou conhecimento ? pode ser usado, mas que o do Karma-Yoga é o mais acessível para as pessoas comuns.

Podemos ilustrar a relação entre Karma, Bhakti e Jñana da seguinte forma: imagine uma altíssima montanha, com três estradas levando ao seu topo. Duas são pavimentadas e têm carros possantes a nossa espera para nos levarem com toda a rapidez e tranqüilidade. A terceira precisa ser vencida a pé, é esburacada, íngreme e tortuosa, com muitas pousadas confortáveis, fontes com água fresca, jardins com árvores ricas em frutas e sombra às suas margens e cheia de entroncamentos de onde descem de volta ao sopé caminhos fáceis e agradáveis. As duas primeiras estradas são Bhakti-Yoga e Jñana-Yoga: se tivermos as chaves dos carros o caminho fica muito mais fácil e rápido, mas encontrar essas chaves é coisa para pouquíssimos. A terceira estrada é o Karma-Yoga: a renúncia aos frutos da ação é um caminho difícil e cheio de oportunidades de perdas de tempo ou de desistência, mas pode ser percorrido passo a passo, por qualquer um que saiba andar e só depende da força de vontade. Sim, muita força de vontade, mas apenas dela.

O texto segue afirmando que o altruísmo é o caminho moral e que, como a moral é relativa, a que deve ser buscada é a que impera nas condições em que nos encontramos. Vivekananda diz que mesmo os frutos das ações positivas devem ser renunciados porque não nos é possível fazer bem ao mundo do ponto de vista absoluto. ‘Para que uma onda se erga à superfície das águas deve haver uma depressão equivalente.’ Ou seja, o bem e o mal já estão no mundo e não nos é possível aumentar a quantidade de um ou diminuir a do outro. ‘A soma de prazer e dor será sempre a mesma.’ Por isso, nosso trabalho não tem valor em termos absolutos. Porém, apesar de sermos parte do absoluto que é imutável, somos dele a parte que vive no mundo, que é sujeita às leis do tempo e do espaço e, portanto, da relatividade. Então fazer o bem em termos relativos nos é possível e fundamental e é assim que devemos viver até voltarmos ao absoluto.

Como é impossível diminuir a dor do mundo, o conceito de ‘igualdade’ (entre as pessoas) é absurdo. Ela nunca chegará, devemos viver na desigualdade cumprindo cada um seu Dharma.

Vivekananda termina sua obra louvando Buda como o maior dos Karma-Yogis e o único a atingir a perfeição através desse caminho.

‘Um homem assim representa o mais elevado ideal de Karma-Yoga.’


Renato pratica Yoga em Fortaleza, CE, e é o Webdesigner deste nosso site yoga.pro.br

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Pedro Kupfer em Meditação, Pratique, Yoga na Vida
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Uma resposta para “Karma Yoga, a educação da vontade”

  1. Todos os textos contidos neste site são reveladores, abrem nossa mente para os diversos acontecimentos que nos envolvem e nos faz evoluir. Agradeço.

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