Mohan foi colega de estudos de Desikachar, e ambos aprenderam os Vedas e seus angas com o mesmo guru, Sri Krishnamacharya, em um período em que o mestre lapidava sua abordagem terapêutica, procurando a compreensão de como desenvolver a prática de Yoga levando em conta as necessidades do estudante individualmente.
Mohan e Desikachar também são engenheiros, e os frutos desse coleguismo nutrem o Yoga com o rigor do método científico, para que ele possa ser entendido pela sociedade ocidental como uma metodologia criteriosa, minuciosamente elaborada com o objetivo de recuperar e manter a integridade do indivíduo humano em todos os aspectos (koas). Yoga é o caminho e a chegada de uma pessoa (de volta) para sua verdadeira natureza consciente e realizadora.
Yoga para resolver o problema da mente equivocada
A maioria dos problemas de saúde atuais é originada e agravada por um constante estado de perturbação mental, resultado do estilo de vida afetado pela ignorância (avidya).
A mente comum produz para nós demasiado sofrimento, pois, durante a vigília, encontra-se em estado agitado, obscurecido e distraído. O Yoga cura os problemas da mente ao trazê-la para o estado de foco e absorção, silenciando as perturbações e tornando possível o entendimento das coisas do mundo sem interferências ou falhas na informação. Para que isso aconteça, é necessário apurar a mente, removendo suas impurezas (kleshas).
A prática do Yoga visa a clarear as percepções, a canalizar as atividades mentais na direção desejada e a sustentar o foco sem se distrair (Yoga Sutra I:2).
Percorrendo o caminho da reintegração pessoal
É importante que esse trabalho pessoal seja assistido e orientado por um bom professor, terapeuta ou mestre, sendo que este ajuda a escolher quais as técnicas do Yoga são mais adequadas para o caso em particular e como vão ser utilizadas no tratamento. Este professor pode também orientar quanto aos ajustes ou adaptações que vão ser feitos na execução das técnicas, levando em conta as necessidades e os objetivos do indivíduo. Este livro expõe os princípios básicos pelos quais é feito o planejamento da prática de reintegração pessoal e pode ser considerado um bom guia, muito útil para auxiliar o estudante a entender e construir sua prática personalizada.
O método da terapia yogue da reintegração pessoal baseia-se principalmente em ásana, pranayama e meditação, ou seja nos ramos práticos do Yoga clássico de Patañjali, de onde crescem naturalmente os outros ramos.
Asana, a porta de entrada do caminho da reintegração
O corpo é usualmente o espaço natural para se começar a prática de Yoga. É algo concreto e palpável; sendo assim, é parcimonioso começar-se a partir da disciplina física do Yoga. É mais fácil começar da forma mais grosseira, e, então, ir gradualmente trabalhando na direção dos aspectos mais sutis. A prática correta de asanas serve para promover a integração estrutural, fortalecendo, equilibrando e estabilizando uma unidade integrada formada por corpo, mente e respiração.
A prática dos asanas de reintegração deve respeitar alguns princípios básicos:
1. Ela deve ser equilibrada e confortável e deve tornar o corpo forte e flexível.
2. A coluna deve receber uma ênfase especial, a fim de se corrigir a postura e proteger o sistema nervoso.
3. O roteiro da prática de asanas deve ser adaptado ao estudante para que ele alcance seu objetivo. A prática deve avançar em uma seqüência de passos concatenados e inteligentes (vinyasa krama).
4. A respiração deve servir para adaptar o esforço nas posturas. A respiração também deve integrar o corpo e a mente, servindo inclusive como feedback da prática.
Cada um desses aspectos fundamentais da prática de asanas de integração é bem trabalhado no livro, e isso cria um campo para que o estudante consiga organizar o roteiro de sua própria prática, uma vez conhecido seu objetivo, construir o ambiente da prática e conduzi-la como se fosse uma sinfonia.
O vinyasa krama é o planejamento da seqüência de passos inteligentes e concatenados que o estudante executa para chegar em seu objetivo e sustentá-lo com segurança. Também significa ‘sincronia’. O autor faz considerações sobre o planejamento da prática, como a importância de ser objetivo, de preparar-se bem para alcançar o propósito, de usar as posturas como ferramentas para promover equilíbrio ou harmonização, como e quando fazer o repouso e o encerramento da prática. Explica como escolher os objetivos, que podem ir mudando no decorrer do caminho para tornar a busca aprimorada e sustentável, e também como criar uma seqüência de procedimentos simples para alcançar o objetivo proposto. Uma vez que seja entendido o que se pode esperar de um ásana, ou de uma técnica ou procedimento qualquer, a prática deve então ser adaptada e preparada de acordo com as necessidades individuais para atender ao objetivo proposto.
O papel da respiração noprocesso da reintegração pessoal
Pranayama, a prática da respiração, é um dos mais importantes meios de promover a integração funcional, ou seja, quando o fluxo de energia do sistema fica em ordem, dirigido para um foco. No decorrer do processo, isso leva também à integração psicológica. Essa prática é o maior dos kriyas (disciplina de purificação) e remove as impurezas da mente, ajudando na concentração. O pranayama correto deve servir para promover a união do corpo e da mente, mantendo a mente focada e centrada na atividade presente da respiração.
Meditação em movimento
A terapia yogue compreende que o ser humano é integrado, e as alterações por intervenção terapêutica em um nível de existência pessoal, seja o físico ou fisiológico, exercem efeitos também em todos os demais níveis. Com uma ação efetiva, o praticante pode conquistar a saúde plena da estrutura com asana e, o domínio das funções energéticas com pranayama. Assim terá um bom alicerce para o trabalho no plano psicológico, pois a ausência de integridade psicológica leva à depreciação estrutural e funcional e vice-versa. Quando a mente é perturbada, o corpo e a respiração também são perturbados. Técnicas de meditação tratam desse problema diretamente. Além disso, vários asanas e pranayamas colaboram para que a integração aconteça, graças ao uso bem coordenado do corpo e da respiração.
A integração começa a ocorrer quando se trabalha o vinyasa, na medida em que o praticante começa a experimentar uma espécie de estado meditativo ou de contemplação, mediante a sincronia dos movimentos existentes entre o corpo, a respiração e a mente.
A integração social aparece como o resultado natural da sincronicidade gerada por essas várias práticas e formas de integração. Quando nossos estados estrutural, funcional e psicológico estão em ordem, somos capazes de assumir um posicionamento adequado e empenharmo-nos numa direção social aceitável.
Presença constante e autodescoberta
O mais importante de tudo na prática do Yoga é o constante senso de descoberta de si mesmo. A chave para desenvolver-se a vitalidade na prática é a observação constante, já que a conexão com o presente de todas as alterações e adaptações que precisam ser feitas no caminho tornam-se oportunas e adequadas.
Uma prática bem-sucedida é aquela executada com regularidade e incorporada a todos os outros aspectos da vida. Uma vida de qualidade é feita da harmonia do inter-relacionamento entre alimentação, atividade, lazer, sono, socialização, etc.
O caminho para a reintegração pessoal é o da liberdade de viver o presente, com atenção, reflexão e gratidão, aliando disciplina dos sentidos e uma mente refinada que nos permita perceber nosso lugar no mundo e continuar progredindo, realizando e ajudando a vida.
Mirko da Costa atualmente trilha o Yoga como caminho, entre Florianópolis e Curitiba.
Essa sua resenha foi originalmente publicada nas páginas 98 a 102 da edição no 03, do Inverno de 2004, dos Cadernos de Yoga.
Olá! Eu gostaria de saber aonde encontrar esse livro resenhado pelo Mirko Costa.
Aguardo resposta.
Juliana.
Mirko,
Tenho ouvido aqui e ali comentários sobre o seu trabalho. Em Floripa, através da Carla, amiga da Cláudia Tibana. Talvez sejam suas alunas hoje em dia. Outro dia, em Campo Grande, MS, de onde sou, alguém indicou o seu nome para um workshop.
Essa resenha está perfeita, e eu ainda não havia lido nos Cadernos de Yoga.
É engraçado que os indianos, no afã de tornar o Yoga mais compreensível para os ocidentais, criam e recriam obras profundas e sábias a partir dos textos e conhecimentos milenares. Bom para nós, bom para o Yoga, cujos fundamentos sólidos e reveladores se atualizam (na forma de narrar ou de entender) constantemente em benefício da Humanidade.
Obrigada, namaste!
Adriana.