Esta pergunta está no livro ‘A árvore do Ioga’ de B. K.S. Iyengar. Escolhi esse tema porque esta questão mexeu comigo. Após a leitura do livro, ela continuou martelando em minha cabeça durante muito tempo, trazendo reflexões e me fazendo buscar uma resposta sobre o meu próprio sádhana.
A palavra sádhana pode ser traduzida como a prática constante (abhyasa), meio de realização ou caminho espiritual que conduz à perfeição/libertação. Não sendo então a prática cotidiana um fim em si mesmo, o sádhana deve ser um esforço espiritual.
Diz a Gheranda Samhita:
‘Assim como se inicia a aprendizagem pelo alfabeto, até culminar com a leitura [e compreensão] dos shastras, do mesmo modo, dominando as técnicas do Yoga, se pode alcançar o entendimento da Realidade.’
Outro texto, a Hatha Yoga Pradípika, diz em palavras diferentes algo semelhante:
‘O sucesso no Yoga não é alcançado pela mera leitura dos textos sagrados. O sucesso não é obtido ao se vestir a roupa de yogi ou de um sannyasin (asceta) ou falando sobre o Yoga. Apenas a prática constante é o segredo do sucesso. Verdadeiramente, não pode haver dúvida quanto a isso’.
Compreender o que foi dito acima é compreender que além do esforço físico, da mente, do corpo, dos sentidos, da razão e do Eu é que se obtém sucesso na prática. Através de renúncias, escolhas e gestos que reflitam que não é através da experiência que se obtém na prática que estaremos praticando yoga, mas sim estendendo o conhecimento que acontece na prática e que você vai aplicar na vida.
Confesso que a compreensão dessa abordagem não era muito clara para mim no início. Assim como outras pessoas meu primeiro objetivo e foco era dominar o desafio de realizar posturas difíceis e acrobáticas, sendo então esse sádhana o que Iyengar chama de sádhana sensual ou físico. Ao descobrir toda a disciplina ética por trás da técnica descobri toda grandeza que yoga propõe.
Patanjali diz em seu segundo sutra Yogashchittavitti nirodhah, que literalmente se traduz como ‘Yoga é a restrição/supressão da identificação com as flutuações da consciência.’
Portanto, se o Yoga é o aquietamento das ondas mentais como o sádhana espera-se alcançar o momento, sem a presença do corpo, mente ou Ego, apenas do Ser. Se a prática é feita desta forma nos afastamos do caminho sensual e começamos a trilhar o caminho espiritual, da autodescoberta sobre a plenitude do Ser. Mas como trilhar um caminho espiritual fora da prática física ou a partir dela?
Na introdução do livro ‘Gita segundo Gandhi’, Mahadev Desai descreve o Yoga da seguinte forma: ‘…significa uma atitude da alma que permite alguém encarar a vida com equanimidade…’
O interessante nesta afirmação é a presença da palavra atitude, o que demonstra que o estado de Yoga, ou melhor, o Yoga é, portanto, uma forma de posicionamentos, escolhas e ações que vão muito além da sala de prática. Na mesma citação acima há outra palavra importante para um yogi, equanimidade, que quer dizer manter o ânimo sempre igual, tanto na adversidade com nos bons momentos, ou seja, aceitação.
Na minha visão, a aceitação deveria pautar toda vida do praticante. Desde a aceitação de quem/do que sou, quanto daquilo que posso realizar em minha prática. A prática física é um bom aferidor para o grau de aceitação do yogi, devendo este ser honesto em ver se o tipo de prática que fazemos é o tipo de prática que cabe à mim, ou seja, a mais adequada. Percebendo e aceitando minhas limitações coloco-me pronto para o reconhecimento sobre a verdade do Ser.
Chegamos aqui em um ponto importante para evolução do sádhana físico para o espiritual, o Ego. Até onde o Ego de um praticante interfere em seu sádhana? Outra vez a prática física serve como espelho para a vida. Por exemplo fazer bem um ásana não deveria ser motivo de orgulho de um praticante. O orgulho trás o desejo de reconhecimento por suas qualificações e habilidades na prática e no cotidiano também.
Numa análise mais cuidadosa, é possível afirmar que o ego, sendo um aspecto da mente, deve ser reduzindo ao máximo necessário para que o praticante possa gozar de simplicidade e da verdadeira compreensão do Ser.
Aquele que faz sua prática em busca de reconhecimento e para impressionar os outros, pratica o Yoga sensual, o sádhana físico. Não há formas de qualificar ou medir um sádhana espiritual ninguém pode fazê-lo além do praticante. O que diferencia, então, o sádhana físico do espiritual é atitude interior com que se pratica sendo essa minha experiência, minha vivência sobre o Yoga.
Elisa é yogini e professora em Anápolis, GO. Seu email é ramosveloso@gmail.com.
Bom saber que mais pessoas acreditam que “aceitação” não é sinonimo de babaquice ou desinteresse, ou pior ainda, distanciamento e frieza, que não raro é confundido com crueldade. creio ser o Yoga um bom meio para harmonizar a mente e sintonizar individuos, quem sabe então mais pessoas compreendam que aceitação é só o que é: equanimidade.
Adorei o texto! Está de parabéns!
Sim! Parabens pelo artigo Elisa, e boas praticas.
um beijo.
Harih Om!
Elis!!! Parabéns pelo texto, pela vivência e pela transmissão de seu conhecimento! Valeu! Forte abraço!
Muito esclarecido o artigo, parabéns.
Abraço,
Fabiano.
Elisa, querida!
Muito legal seu texto. Obrigada pela inspiração!
Bjs!!!
Si