Pratique, Yoga na Vida

Karma Yoga

Algum tempo atrás, estava refletindo sobre o Karma Yoga, conhecido como o Yoga da ação desinteressada, e pensava: 'Será que existe mesmo alguma ação que seja desinteressada?'

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Algum tempo atrás, estava refletindo sobre o Karma Yoga, conhecido como o Yoga da ação desinteressada, e pensava: ‘Será que existe mesmo alguma ação que seja desinteressada?’

Refleti sobre isso a partir da experiência que tive ao trabalhar diversos anos na área social. Seja como educadora que como voluntária sempre encarei isso como um serviço, e apesar das dificuldades, sempre tive a impressão de receber muito em troca. Quando você começa um trabalho social você de fato tem a intenção de fazer uma coisa boa, de ser útil, de doar parte do seu tempo ou dos seus recursos. De fato, não pensa naquilo que vai vir depois, essa é uma ação desinteressada. Mas quando, após um tempo de dedicação a esse trabalho você pára e reflete sobre aquilo que aconteceu, você percebe que algo em troca recebeu. E quando você volta a se dedicar novamente a esse projeto, mesmo sem pensar num retorno, você já sabe que a partir disso irá colher muito frutos.

Uns dias atrás me pediram para desenvolver uma oficina com um grupo de mães cujas filhas freqüentam um projeto social. O tema proposto foi ‘Estresse, Ansiedade e Depressão’. A coordenadora do projeto me chamou pelo fato de eu ser professora de yoga e por ter desenvolvido alguns trabalhos de corporalidade com as atendidas, a partir disso poderia falar algumas coisas sobre o tema. Assim, preparei uma proposta com a idéia não de dar uma aula de yoga, mas de deixar que as mães se manifestassem a respeito daquilo que vivenciam no dia-a-dia.

Começamos a oficina com alguns exercícios de alongamento, com um mapeamento do corpo e uma auto-massagem. Foram poucos minutos com exercícios super simples e que as mulheres demonstraram ter apreciado bastante.

Em seguida, queria que elas refletissem sobre estresse e, assim, perguntei para elas o que isso seria. Na minha cabeça tinha pensado vários tipos de respostas que elas poderiam me dar como, por exemplo: o estresse é ansiedade, angústia, um mal-estar. Mas qual foi a minha surpresa quando uma das mulheres disse: ‘Para mim, estresse é não ter como alimentar meus filhos. Estresse é falta de comida em casa’. Frente a isso parei e, em alguns segundos, várias coisas passaram pela minha cabeça. Como poderia continuar a atividade após uma resposta dessa?

Já conhecia as situações difíceis nas quais essas mulheres vivem. Situações bastante estressantes para qualquer ser humano, mas isso logo de cara foi difícil. Continuei a oficina deixando que elas desabafassem suas angústias e suas experiências, de como muitas vezes enfrentam as situações difíceis do cotidiano. Falamos do corpo e de como esse estresse causa dores e desconfortos no nível físico e, juntas, refletimos sobre as maneiras e os momentos que temos para cuidar da gente mesma. Terminamos a atividade com um relaxamento.

Foi pouco tempo, uma hora e pouco, mas foi intensa e as mulheres me agradeceram tanto dizendo que naquele dia iriam trabalhar e fazer suas correrias com muito mais ânimo e disposição. E, assim, eu saí do grupo e terminei meu dia agradecendo a Deus por ter tido essa experiência tão intensa e importante.

Pensando na oficina, a minha intenção era a de transmitir algo que pudesse ser bom para elas, algo simples, alguns cuidados para evitarem o estresse, alguns exercícios, posturas. Mesmo conhecendo a realidade de vida delas, pensava naquele estresse devido ao fato que hoje como mulheres trabalhadoras e mães somos continuamente solicitadas, carregando responsabilidades com a casa, com os filhos, mas quando o estresse é gerado pela falta de algo tão essencial como o alimento, a gente percebe a força que essas mulheres têm para encarar os problemas.

Aí você agradece a Deus por aquilo que você tem e todo estresse se torna pequeno frente a isso, e você percebe que quem ensinou alguma coisa nesse dia foram elas, e não você. Então, mais uma vez você agradece por ter tido essa oportunidade. E mais uma vez se pergunta: será que o Karma yoga é de fato uma ação desinteressada?

Quando trabalho com essas mulheres eu gosto e agradeço porque com elas percebo a força e a coragem do ser humano. Percebo como pequenos gestos possam fazer a diferença no dia-a-dia ou na vida de uma pessoa. Muitas vezes doamos com a expectativa ou a esperança de uma grande transformação, mas as mudanças acontecem de forma tão simples e sutil que devemos estar preparados para percebê-las. È assim que Deus ou Isvara se manifesta. Se não prestarmos atenção às pequenas coisas, Ele passa desapercebido.

Muitas vezes, a gente não se dá conta de quanta diferença possa fazer uma ação, algo que a gente considera às vezes insignificante, uma palavra, um gesto, uma hora dedicada à escuta de quem não tem com quem desabafar, um cuidado, um abraço, umas posturas de yoga para o bem-estar, para o outro pode fazer muita diferença. A gente de repente não vai mudar o mundo, mas vai movimentando energias e pensamentos de amor, de paz e comunhão, pequenas sementes que brotarão com o tempo.

Termino aqui com as palavras sábias do professor Hermógenes: ‘É de fato dever servir o Yoga. E, servindo o Yoga ele nos serve. Agora, trabalhar Yoga somente pensando em si mesmo, pode ser muito freqüente, muito aceito, mas eu acho que o Yoga que eu pratico é para beneficiar o mundo. Oferecer o fruto das ações a Deus. Servir. Yoga é servir. Agora, praticar o Yoga para me iluminar sem pensar no sofrimento que o mundo padece não é meu caso’.

Namastê!

Elda mora com suas duas filhas e seu marido Paulo pertinho da cidade de São Paulo.

A ONG que ela menciona neste texto chama-se Associação de Apoio a Meninas e Meninos da Região Sé. O website da ONG é www.aacrianca.org.br.

Eles tem um belo projeto dentro desta ONG: a Revista Viração, produzida e dirigida por adolescentes: http://www.revistaviracao.org.br/. Visite, apoie, colabore! Faça sua parte!

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