Pratique, Yoga na Vida

O sono da morte em confluência com a morte em vida

Sabemos que não viveremos para sempre, mas talvez isso aconteça só no plano intelectual. Mas, quando a vida nos coloca a prova, percebemos que o buraco é muito mais embaixo

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Sabemos que não viveremos para sempre, mas talvez isso aconteça só no plano intelectual. Aprendemos muita teoria, filosofamos sobre as questões existenciais e racionalmente cremos piamente que possuímos entendimento sobre tudo. Mas, quando a vida nos coloca a prova, percebemos que o buraco é muito mais embaixo. Aliás, bem mais, embaixo.

Há milênios, e muitas décadas vêm-se discutindo à reencarnação. Algumas religiões aceitam tal fato, outras, nem querem ouvir falar sobre isso. Entretanto, sem entrar no mérito de qual é a verdade, um dia a morte vai bater na sua porta. Creio que, esta é uma das poucas certezas que se tem na vida ? um dia morreremos.

Em muitas filosofias, em um determinado momento, o monge ou discípulo vêm a conhecer a data de sua morte. Em outras, são realizadas práticas de meditação, nas quais, a morte é afrontada para que não seja mais um empecilho no desenvolvimento ou evolução espiritual do praticante.

Todavia, em muitas religiões a morte vem a ser temida, e isso, este temor, vai sendo transmitindo de geração para geração, e fortalecendo-se a cada década. No Brasil, pela forte influência cristã, sofremos pela força desse medo, e quando a morte chega, todo o temor coletivo aflora, e o sofrimento é enorme e generalizado; e no fim, não estamos sofrendo pela perda do ente querido, mas sim, pela nossa própria morte.

Henriques (2001) diz que em verdade, sempre choramos pela nossa própria morte, tomada aqui como rompimento com a dimensão do nosso ser, vinculado e dependente do próximo, recém-finado. Algo parecido é buscado pelo yogi, em sua experiência de morte em vida, jivamukti, onde toda a estrutura do ego se desfaz por completo, por inteiro.

Frawley (1996) reflete que a morte é um sono prolongado. Onde mergulhamos na consciência mais profunda, sendo conservados apenas o Prana causal e os karmas, sendo que essas impressões, como os sonhos para nós, criam diversos mundos sutis e astrais, como os céus e infernos, que a mente sutil visualiza. E estes podem ser bons ou maus, dependendo do karma e da experiência vital. Ou seja, a morte é uma transformação.

Onde, saímos do nosso invólucro, como o casulo da mariposa, e viramos a própria expressão da consciência. Respirar profundamente, por entre lágrimas e entender a missão da outra pessoa acabou e que não podemos lutar contra o destino e a força divina, se confunde com o fato de que, a morte nos trás de volta a percepção de que somos mortais e que um laço afetivo se desfez.

Ao rompermos um laço, antes, interligado a um outro alguém, danos são ecoados na psique, pela desestruturação da perda de algo que era um dos sustentáculos de nossa própria personalidade e vida. Ainda mais, se analisarmos do ponto de vista védico que todos somos parte da Consciência Suprema, brahmam, fica claro que não há distinção entre o ‘EU’ que ficou, e o ‘EU’ que morreu, pois somos todos UM. Então, voltamos ao que Henriques (2001) disse a cima do choro pela própria morte.

Como um pedaço foi arrancado pelo destino, e muitas vezes de surpresa, o vazio que fica muitas vezes assusta, talvez pela sensação de liberdade e recomeço que proporciona. A saudade e a lembrança da pessoa antes tão amada, real e presente, perdurará para todo o sempre nas mentes e corações daqueles que permanecem fisicamente na Terra.

Mas a janela que se escancara para o aprendizado da alma individual dos sofredores é imensa. Escolher estar presente no escorrer de cada lágrima, na culpa, nos arrependimentos e nas lembranças é uma grande dádiva deixada por aqueles que desencarnaram, e é nossa obrigação agarrar essa oportunidade de desenvolvimento espiritual.

Nada acontece por acaso, nem o cair de uma gota do céu, nem o atraso do relógio que deveria despertar no horário habitual e muito menos em uma morte. A força divina é sábia e sabe muito bem do que as consciências individuais precisam viver, para na morte, voltar aos braços da Mãe divina.

Se aqui na Terra ficamos, é porque ainda temos uma missão a cumprir, e não podemos abandoná-la. A dor da perda é imensa, e não há nada de errado em senti-la integralmente e visceralmente, mas, é essencial que não percamos o foco, e sempre que faltar forças e luz em nossa alma entre em contato com a fonte divina ? ore e reze da forma que mais lhe agradar ou medite.

Tenho certeza que aquele que foi está muito melhor do que nós e confortavelmente repousa na consciência universal, e sei que a lembrança nunca me deixará, nem mesmo, o amor que um dia compartilhado e vivenciado. Por isso, este texto foi dedicado à força divina que trouxe a experiência da morte, da dor e do renascimento.

Deixamos aqui uma mensagem de amor, entendimento e aceitação para com os acontecimentos de perda, para todos aqueles que sofrem pela morte de um ente querido e de depressão pós-morte. Que a luz brilhe em seu coração e que sua alma se preencha de aceitação, pois, a vida continua. E se você é um yogi, sabe que a morte não precisa ser temida, pois é inevitável, pelo menos, no campo físico. A alma, repousa na eternidade.

No amor da Amma,

Aninha.

Referências:

Frawley, David Dr. Uma visão ayurvédica da mente ? A cura pela consciência. Tradução: Alípio Correia de Franca Neto. Editora Pensamento. São Paulo. 1996.

Henriques, Antônio Renato. Yoga e Consciência. Editora Rígel. 2001.

Ana é professora e yogini em Sampa. Seu email é aninha_malagueta@hotmail.com.

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