Conheça, Yogaterapia

O Nascimento da Devī: por uma Gestação Plena

A preparação para uma gestação saudável e feliz deve começar bem antes do período de concepção. Mas como a maioria não planeja nada e muitas vezes é surpreendida por um teste positivo, a incursão à prática de Yoga pré-natal será mais do que o suficiente e ricamente benéfico tanto para mãe quanto para o bebê.

· 18 minutos de leitura >
nascimento

Birth is not only about making babies.
It’s about making mothers – strong, competent,
capable mothers who trust themselves
and believe in their inner strength.
Barbara Katz Rothman.

Nascimento feliz e integrado com Yoga e Āyurveda

Como mulheres, passamos por três grandes mudanças em nossas vidas: menarca, gestação e menopausa. Como a segunda é o único período vivido por muitas, mas nem sempre por todas, será o nosso objeto de estudo.

Segundo Maria Inês e Walkyria Dambry (2004) com base na visão ayurvédica, “a gestação é kapha, momento em que a criança é gerada, se desenvolve e cresce. A gestante está repleta de líquido, contém uma bolsa gestacional, edemas abundantes [nem todas], está letárgica e emotiva.

O momento de trabalho de parto é vata, o movimento é fundamental tanto por parte da mãe quanto da criança entre força e relaxamento. O momento de expulsão é pitta, realização efetiva de todo o processo de geração e nascimento.”

Para o Ayurveda a preparação para uma gestação saudável e feliz deve começar bem antes do período de concepção.

Mas como a maioria não planeja nada e muitas vezes é surpreendida por um teste positivo, a incursão à prática de Yoga pré-natal será mais do que o suficiente e ricamente benéfico tanto para mãe quanto para o bebê.

A indicação de atividade física e em especial do Yoga é quase uma unanimidade entre obstetras, adeptos ou não do parto humanizado e natural.

Alguns dos benefícios do Yoga na gestação são:

1. proporciona uma gestação, um parto e pós-parto mais saudáveis e tranquilos, redução do estresse da ansiedade;

2. relaxamento;

3. consciência do novo Ser que se desenvolve dia a dia; melhora da circulação sanguínea e linfática;

4. fortalece o assoalho pélvico;

5. ajuda na preparação dos seios para amamentação;

6. melhora a respiração e a oxigenação para o bebê;

7. readaptação ao novo eixo de gravidade.

nascimento

Sparrowe (2002) enfatiza, “Embora o Yoga em geral crie espaço para o bebê demtro do seu corpo, o Yoga pré-natal cria espaço para o bebê em sua mente.”

Cada gestação é única e o Yoga servirá como a chave do tesouro. Balaskas (1993) complementa que a ênfase durante a gravidez deverá repousar sobre o desenvolvimento da responsabilidade e da confiança no próprio corpo e no aprender a descobrir seu potencial instintivo para dar à luz e se tornar mãe.”

Assim sendo, adentremos o maravilhoso mundo das dez luas gestacionais, tempo considerado como necessário para uma gravidez a termo.

O Primeiro Trimestre

Corresponde ao período mais importante – o da formação do bebê. Momento de adaptação e revolução hormonal.

Por conta de todo este “agito” interno, a mulher pode se sentir cansada e muitas vezes passar por algumas alterações de humor como nos períodos pré-menstruais, como a insegurança e com medo, irritação ou irracionalidade, sentir-se despreparada ou incerta quanto a sua habilidade à maternidade ou com dificuldade de aceitação à nova realidade.

A mulher está literalmente com a sensibilidade à flor da pele! Por isso pode se pegar chorando com um comercial de televisão! No que aparentemente pode parecer o caos, conseguiremos criar todos os alicerces que assegurarão uma gestação mais saudável e equilibrada.

A base da prática advém principalmente dos exercícios respiratórios básicos, como respiração diagfragmática e intercostal. Tolle (2005) afirma que “Ao sentir a respiração e ao aprender a prestar atenção nela, você se conecta à natureza da forma mais íntima e poderosa.

É um ato extremamente curativo e reabastecedor. Ele promove uma mudança, passando do mundo conceitual do pensamento para o mundo interior da consciência livre de condicionamentos.”

A prática diária dos pranayamas ajudará a renergizar seu corpo e mente caso você esteja se sentindo mais cansada do que o habitual nos primeiros meses de gestação visando a conexão do corpo físico, que está se transformando, à mente em busca de aceitação, adaptação, união e compreensão.

Prāṇa, a energia vital, funcionará como uma âncora que nos centra no momento presente e ajuda a clarear os pensamentos, as confusões mentais e as oscilações hormonais; e o mais importante de tudo, com naturalidade.

Com uma boa nutrição “pránica”, não somente através da respiração, mas de uma alimentação mais viva e natural, a mulher conseguirá alcançar um nível de pureza maior, ou seja, estará mais sáttvica, o que é essencial para gerar um bebê mais saudável.

Lad (2007) aponta a importância do prana na gestação, “Prāṇa governa as funções biológicas das outras duas essências ojas e tejas. Durante a gravidez, o umbigo do feto é a principal porta por onde prana entra no útero e no corpo do feto. Pran  governa também a circulação de ojas no feto.

Assim, em todos os humanos, mesmo naqueles que ainda não nasceram, um distúrbio do prana pode criar um desequilíbrio de ojas e tejas, e vice-versa.”

Yoga é mais do que união, integração e junção de corpo-mente-espírito, mas sim, uma junção de dois Seres que estão em ativo e pleno desenvolvimento em busca de sattva, o perfeito equilíbrio entre ha e ṭha, o Sol e a Lua.

Sattva traz luz à nossa consciência, ajudando-nos a enxergar além dos nossos gostos e aversões e padrões mentais, olhando a realidade como ela é e não como queremos ou acreditamos que seja. Isso é trazer jyoti (a luz) a nossa realidade e viveka, o discernimento.

Evitando desentendimentos, falsas percepções e julgamentos indevidos, auxiliando-nos a cultivar relacionamentos reais e sinceros; assim como contribuindo a “digestão” de todos as emoções conflitantes que possam surgir nesses primeiros meses.

O Segundo Trimestre

No segundo trimestre, a maioria dos desconfortos iniciais já passaram para a maioria das gestantes e inicia-se a fase da mais completa plenitude. A energia e o bem-estar voltam a fazer parte da sua vida e você está se sentindo mais bonita e de bem consigo mesma do que nunca!

Uma dieta completa, saudável e natural já deve fazer parte dos cuidados diários, pois sua nutrição extende-se ao bebê em desenvolvimeno, enquanto seu corpo prepara o leite materno. A Dra. Silvia Mattoso Gioielli, especializada em Ayurveda, Pregnancy and Baby Care, indica os seguintes cuidados quanto à alimentação:

  • Procure consumir alimentos frescos e integrais, como vegetais, frutas, grãos e laticínios. Caso haja possibilidade, prefira os orgânicos. Evite tudo o que for enlatado, longa-vida e alimentos geneticamente modificado;
  • A comida deve ser gostosa, apetitosa. Não exagere nos crus: os alimentos cozidos são mais fáceis de digerir, mais nutritivos e dão uma sensação de conforto;
  • Relaxe e curta o momento de preparar e desfrutar a refeição. Sente-se para comer. Procure alimentar-se em um ambiente calmo, com conversas amenas e felizes, sem muito barulho e sem aglomerado de pessoas. Não deixe a sua refeição se perturbada ou constantemente interrompida;
  • O desejo durante a gestação é bastante comum. Segundo o Ayurveda, esse desejo parte do bebê, é a sua vontade que se manifesta na mãe. Portanto, se você notar algum desejo alimentar incomum, que você não costumava ter, procure satisfazê-lo.
  • Caso você deseje algo pouco saudável, consuma, mas só o suficiente cessar a vontade. Para o Ayurveda uma dieta balanceada é aquela que contém os seis sabores (doce, salgado, ácido, amargo, picante e adstringente) e é ela a melhor prevenção para desejos alimentares não apropriados;
  • De uma forma geral, reduza os alimentos muito picantes, exageradamente amargos e adstringentes. Reduza drasticamente os alimentos crus e não consuma bebidas e alimentos gelados, pois isto reduz o agni – o fogo digestivo, prejudicando a digestão e o aproveitamento adequado dos nutrientes.

Seguindo essas regrinhas básicas para uma boa nutrição e o abandono do sedentarismo, conforme as indicações médicas e nutricionais, seu ganho de peso será mais saudável e proporcional à uma boa demanda de prana, ojas e tejas, agni (o fogo biológico que governa o metabolismo) e o equilibrio entre os três prevalecerá.

Lad (2007) cita que “Durante o oitavo mês de gravidez, ojas proveniente do corpo da mãe vai para dentro do feto. […] Assim como ojas é fundamental no início da vida, é necessária também para a longevidade.”

Procure também se alongar, – sem exageros, pois agora não é momento de superação mas sim de acolhimento, devido ao hormônio secretado pela placenta, a relaxina, que naturalmente amolece os ligamentos, os tecidos da pélve e da coluna, assim como também os órgãos internos – se movimentar e preencher o dia com tudo que te faça sorrir além das atividades diárias relativas ao seu trabalho.

Qualquer postura que comprima, contraia os músculos abdominais ou em decúbito ventral devem ser evitadas, assim como aquelas nas quais não se sinta bem. Converse com seu professor. Aproveite também o bom fluir da energia e disposição para preparar o corpo e a mente para o último trimestre.

Yamas e Niyamas

Com o decorrer dos meses e a aproximação da data susposta de parto convêm se perguntar e refletir sobre os yamas e niyamas fora do mat (tapetinho de prática). Pense, como você quer educar seu filho? Quais os valores que deseja transmitir ?

E com isso em mente, coloque tudo em prática. Lembre-se que a educação já começa no ventre! Tudo que você sente e experimenta neste período é transmitido ao bebê pelo cordão umbilical conectado a placenta.

Por isso procure cultivar satya e seja sincera na sua prática, respeitando seus limites e indicações do professor, procure também ser honesta com seu companheiro e filhos e obstetra, procurando estabelecer um relacionamento onde a comunicação aberta seja essencial, onde você possa compartilhar os medos, inseguranças, dúvidas e questionamentos.

Para que assim conflitos não resolvidos não aflorem na hora do parto e atrapalhem o seu progresso.

Certifique-se que esteja tudo bem entre você e sua mãe e com o seu nascimento (muitas complicações em trabalho de parto advém dos traumas do nosso próprio nascimento), assim como entre você e seu companheiro.

Veja como ele se sente com o fato de ser pai, quais são seus medos, inseguranças e cheque seu desejo ou não em acompanhá-la no parto.

A maior sabedoria é aprender o momento de falar, de ouvir e de se calar. Algo que conquistamos com a prática, principalmente do brahmacharya, a moderação. Nem tanto ao céu nem tanto a terra.

Com sinceridade, com carinho e sem violência, ahimsa. Falando na hora certa sem roubar o tempo dos outros desnecessariamente, praticando asteya.

Cultivando a não possessividade, aparigraha; respirando e reflitindo algumas vezes antes de responder a alguém com a primeira coisa que vier a cabeça. Talvez, a melhor decisão seja sair para dar uma volta, arejar a cabeça e só depois reiniciar a conversa.

O que muitas vezes pode exigir esforço e disciplina, tapas, para não seguir um impulso, o que na maioria das vezes é o reflexo de padrões que nos mantém presos ao ciclo de samsara, nossa existência condicionada. Liberte-se! Permita crescer como mulher e expandir esse bem-estar a toda sua família de dentro para fora.

O Último Trimestre

Ao alcançar o último trimestre o corpo da mulher já sofreu grandes alterações e o bebê já consegue ouvir, sentir e diferenciar muitos estímulos que chegam até ele.

Leboyer (2004) aponta que “no útero chegam à criança os ruídos que se produzem no corpo da mãe, estalos de articulações, borborismos intestinais. E dando ritmo ao todo, as batidas potentes, o tambos grave do coração materno.

A voz, finalmente. A voz da mãe, que marca para sempre com sua impressão o bebê. Cada voz é única, inimitável. Tanto quanto as impressões digitais. A criança fica marcada pela voz da mãe. Ela conhece essa voz, bem antes de ter visto a luz do dia. É enlaçada em sua trama, em suas modulações, em suas inflexões, em seus humores […]

A criança percebe os sons do mundo, os sons de fora, do mesmo modo como sente a luz. Apesar da espessura do ventre materno.” Isso quer dizer que a prática do pratyahara é primordial para que seu bebê não seja exposto a situações, sons e emoções tóxicas.

Chopra (2006) aconselha, “Leia histórias encantadoras e poesia sensível em voz alta para seu bebê e ouça músicas bonitas e relaxantes todos os dias. […]

“Preste atenção aos sinais de estresse que perceber ao longo do dia e aplique compartamentos de redução de estresse para minimizar os efeitos prejudiciais do estresse sobre você e seu bebê por nascer. […]

“Ponha as mãos sobre a barriga algumas vezes ao longo do dia e envie pensamentos amoroso a seu bebê por nascer”.

Balzano e Mukti (2009) contam que, “No Japão, esta regra é levada tão a sério que a mulher assim que descobre que está grávida passa a seguir o hábito milenar chamado Tai Kyo, que visa prover educação ao bebê na vida intra-uterina.

Ela evita fazer qualquer coisa que traga emoções negativas: deixa de lado os filmes de terror e violência, as músicas muito agitadas e as cenas tristes, e dá preferência a bons filmes, ritmos agradáveis, uma bela exposição de quadros.”

Eu gosto muito de usar os mantras para gerar uma atmosfera de extrema qualidade na vida das pessoas e em especial no período gestacional para tornar esse momento ainda mais mágico e transformador.
A partir do sétimo mês algumas mudanças maiores ocorrem já em preparação ao parto.

Algumas mulheres sentem as contrações de Braxton hicks, o que é perfeitamente normal, – o útero geralmente se endurece por um minuto e depois volta ao normal – é apenas a preparação do corpo ao trabalho de parto, pois elas amolecem e dilatam o cólon do útero. São também um sinal de que o final da gravidez está próximo.

(Claro, se você notar algo de anormal, como dor na parte inferior das costas, perceber que as contrações estão regulares e com diminuição de intervalos ou perda de líquido através da vagina, é melhor comunicar seu médico).

Neste trimestre a realidade é outra, assim como o tamanho da barriga também. A mulher já está mais apreensiva em relação ao parto e saúde do bebê, assim como sonhadora e ansiosa, e aliviada por estar quase chegando a hora de ter seu bebê nos braços.

O útero expandido comprimirá cada dia mais o diafragma – e para algumas pode ser nítida a sensação de falta de ar – assim como também a bexiga e os intestinos, e os órgãos da cavidade abdominal.

Se você é sedentária pode se deparar com liberações de urina ao expirar ou em atividades de impacto. Por isso os exercícios Kegel de fortalecimento do períneo e a prática diária da asvine bandha e mula bandha é essencial e deve ser treinada todos os dias, durante e depois das práticas, antes e após o parto.

Contribuindo na prevenção de situações de incontinência urinária, prolapsos e fortalecendo da musculatura do períneo que precisará estar flexível para alcançar os 10cm de dilatação que trarão seu filho ao mundo e serve como uma prevenção às lacerações e necessidades de episiotomia durante o trabalho de parto, e se houver a necessidade de tal procedimento, será de grande auxílio no processo de cicatrização.

Para isso praticaremos muitos asanas que nos mantém na posição de cócoras e suas variantes.

Aproveite esses asanas para lidar com a constipação; claro que deve ser evitado para aquelas que estão sofrendo de hemorróidas ou com problemas nos joelhos.

As posturas de cócoras ajudam no encaixe e na descida do bebê, além de abrir a bacia e trabalhar as articulações da região coxo-femural e a musculatura do assoalho pélvico. É ótima para o período expulsivo pois aumenta o diâmetro da abertura pélvica e deixando mais espaço para a saida do bebê.

Brahmacariṇī Māyā, em seu livro O caminho da prática, discursa o seguinte sobre a postura de cócoras, “Quando entramos nessa postura inspiramos a respiração da terra para dentro de nós. Como mulheres, nossas energias mais poderosas se juntam abaixo da barriga.

É tão importante receber e revigorar o apāna absorvendo as forças magnéticas da terra através do canal inferior do corpo quanto rejuvenescer o prana pela respiração nasal. [..] Ficar de cócoras permite que as energias da terra entrem por nosso orifício inferior.

A força magnética da terra puxa o apāna, ou ar descendente, para baixo, tranzendo-o a um estado de plenitude. O resultado é que um calor profundo penetra na barriga, mantendo os tecidos e órgãos da parte inferior do corpo em harmonia com as vibrações da terra.

Quando o apāna é recarregado dessa forma natural, ele fortalece e move o prana para todo o corpo.” Em resumo, apana forte, auxilia no processo de soltar, deixar fluir e esvaziar que é o parto.

Algumas outras reclamações durante os últimos meses são azia, indigestão, falta de ar ou insônia – para essa aconselho ler um livro bem chato ou estremamente técnico antes de dormir. Sugiro que comunique seu médico e seu professor para juntos ajudarmos no alívio desses desconfortos.

Sparrowe (2002) diz:

“O amolecimento dos tecidos costuma causar desconforto porque faz com que a digestão fique mais lenta, causando prisão de ventre, indigestão, e inchaço nas mãos e nos pés. Nenhum desses problemas é motivo de alarme, mas se o inchaço vier acompanhado de uma onda de hipertensão ou se for detectada a presença de proteína na urina, é melhor procurar um médico.”

Fique alerta também se edemas aparecerem junto com esses sintomas ou você acordar muito inchada do dia para noite. Mantenha sua energia circulando! Liberando o caminho para o vata, para lidar com os inchaços, falta de energia ou varizes estimulando o sistema circulatório nos meses finais quando o peso se torna excessivo sobre os membros inferiores.

A série de soltura articular, ou pavana muktāsana, é excelente e benéfica ao sistema circulatório. Para a ampliação da energia, pratique posturas que abram o peito (com suavidade e gentileza) e revigorantes, como colocar e deixar as pernas para cima, além de āsanas que estimulem os cakras do coração e da garganta, anāhata e viśuddha, respectivamente.

Como preparação ao trabalho de parto, busque sempre o caminho do meio, sattva, a equanimidade, através dos três R ́s: relaxamento, respiração e ritmo. O livre movimentar-se de maneira fluída e orgânica, conectando-se ao seu ritmo interno e à respiração ritmada e consciente.

Em relação a isso, Balaskas (1993) diz “Concentrar-se na respiração inativa a mente, interrompe o diálogo interno que normalmente ocupa nosso pensamento e aproxima você de você mesma e do seu bebê.

Cada trabalho de parto tem seu ritmo. A concentração nos ritmos da sua respiração vai permitir que você entre em ressonância com esse ritmo, que seja instintiva, e que se renda às forças vitais que atuam dentro do seu corpo.”

Assumindo uma atitude relaxada e conectada conseguimos relaxar muito mais a musculatura da boca que consequentemente relaxa a do períneo.

Maria Inês e Wlakyria Dambry (2004) afirmam que “No Ayurveda, considera-se que o sistema orofacial e o sistema perineal funciona de forma similar e interligada. A organização tônico-funcional do sistema ofofacial só existe se houver a mesma organização no sistema perineal.

A ação do elemento água é fundamental na digestão, pois, sem esse o processo digestivo não se inicia, assim como o elemento água gera um meio favorável a reprodução.” Pratique sim! Pelo menos duas vezes por semana, senão, todos os dias. Mas, acima de tudo, tira um tempo para descansar, parar e contemplar a benção que é estar grávida.

Empodere-se! As portas da mudança só se abrem por dentro

Ser mãe é mais do que ser Pārvatī, é ser Kālī ou Durgā quando necessário, viver os dois lados da moeda, incorporando toda a força da deusa, ou seja, ser a Śakti em todo o seu potencial. É definir o que você quer e lutar para isso.

A humanização do parto não é a mais nova moda e sim o básico e essencial, e na minha visão isso é Yoga. É ser congruente com seus valores e batalhar pelos seus direitos e pelo que é certo e exigir o mínimo de respeito neste momento tão íntimo e delicado. Gandhi foi nosso maior exemplo da busca pela não-violência.

Por isso, aconselho que as gestantes façam o seu plano de parto, para assim se familiarizarem com as fases, as possibilidades, opções, tipos de parto e intervenções que possam acontecer.

O conhecimento é um grande passo para a conquista, assim como a sua participação ativa no parto pode tornar o processo mais vivo e surpreendente, onde você se torna o centro da ação e não a paciente incapacitada. Apodere-se do direito de ter um parto do jeito que você quer e sonha.

Pesquise as opções disponíveis, visite hospitais e maternidades e se informe sobre seus direitos que transcendem o basicão como uma boa hotelaria e uti neonatal, mas que prevêm conforto à mãe e um atendimento mais humanizado para mãe e bebê, para que os primeiros momentos de vida sejam felizes e não traumatizantes.

Uma sugestão é cogitar a possibilidade de se movimentar durante o parto, fazer o uso de banho quente, massagens, óleos essenciais, moxabustão, música, privacidade, companhia do seu parceiro ou até mesmo de uma doula (acompanhante de parto). Hoje, muitos hospitais e médicos aceitam e trabalham com doulas.

Estudos comprovam que a presença de uma doula pode diminuir em 50% as taxas de cesárea, diminuir em 20% a duração do trabalho de parto, diminuir em 60% os pedidos de anestesia, diminuir em 40% o uso de ocitocina e diminuir em 40% o uso de fórceps.

Visualização do nascimento

Aproveite os momentos de relaxamento em shavasana para se concentrar, visualizar e criar a imagem mental do processo e trabalho de parto. Visualizando um canal luminoso (sushumna nadi) do alto de sua cabeça à região da vagina, se abrindo a cada expiração como uma flor de lótus.

Veja o cólon do útero se abrindo e se dilatando, seu bebê se encaixando e descendo. Sinta-se a cada expiração mais relaxada, tranquila e confiante. Liberando assim todas as tensões, preocupações e medos.

Inspire profundamente e conecte-se com seu bebê. Converse com ele e transmita todo seu amor e seus melhores sentimentos. Estabeleça desde as primeiras semanas um vínculo e o nutra a cada dia através do relaxamento consciente.

Mas vai doer?

Estar grávida não é uma doença e parir não deveria ser visto como um calvário ou certeza de sofrimento. É importante esclarecermos isso.

O parto é um processo fisiológico e natural e as contrações não são dores maléficas, mas sim um aviso de que seu útero está fazendo seu trabalho, de que seu bebê está pronto e que a hora chegou.

Você esperou longos meses por esse momento e agora é a hora de realizar karma, a ação que culminará em ter seu filho nos braços.

Meu trabalho como professora de Yoga na prepração do parto e como educadora é fazer com a mulher confie em sua capacidade trazer seu filho ao mundo. Capacitá-las. Reedescobrir a força que há dentro de cada uma. Isso é Yoga. O reconhecimento do que já existe mais foi esquecido. A força do Ser.

É claro que a percepção da dor e sua intensidade varia de mulher para mulher e também de gestação para gestação, porém é importante salientar que sendo uma questão subjetiva é primordial que tentemos compreender o que desencadeia nossas percepções de muita dor ou de nenhuma dor – os saṁskāras e as vāsaṇās (impressões subconscientes, tendências ou disposições que nos condicionam).

Bertheat e Brung (1997) explicam que “…não é a contração que dói. É a dor que trazemos dentro de nós, oculta. O que a contração revela é o sofrimento da própria pessoa.”

A mulher ao parir se expõe a toda sua história como um momento de comunhão e de reconhecimento, onde não há mais barreiras entre o consciente, subconsciente e insconciente, e ali tudo que vinha guardado emerge a superfície.

A forma que isso se dará varia, por isso que algumas mulheres relatam dores insuportáveis e outras não sentem dor alguma, ou até sentem prazer, como foi relatado no documentário Orgasmic Birth.

Balaskas (1993) diz:

“Existe uma correlação definida entre ansiedade, medo e dor. Quando você fica com medo, com frio ou hiperexcitada, seu corpo secreta adrenalina, a qual pode inibir o processo do parto no primeiro período (embora possa desempenhar um importante papel na fase de expulsão).

Seus músculos se contraem, a respiração se torna mais superficial e geralmente você acaba se desconectando do que está acontecendo dentro de você. Isto faz com que a dor aumente. Assim que você relaxar e deixar acontecer, a dor vai diminuir.”

Sparrowe (2002) complementa, “Como as emoções afetam o funcionamento dessas glândulas (hipotálamo e pituitária), a tensão, o medo, o nervosismo e o estresse têm um impacto direto sobre o sistema nervoso e sobre o sistema endócrino (e sobre os do bebê), inibindo a produção dos hormônios que estimulam as contrações do útero, e das endorfinas, que tornam mais fácil suportar a dor.”

Ou seja, se você ficar tensa, se contrair toda, prender a respiração e se desesperar, o sistema nervoso simpático vai ser acionado e a adrenalina vai fluir em seu sangue com a intenção de lutar ou fugir, atrapalhando o trabalho de parto.

Permita que a respiração diafragmática te leve e relaxe, para que assim o sistema nervoso parassimpático seja acionado, as endorfinas sejam secretadas conjuntamente com a occiocina favorecendo as contrações uterinas, a dilatação do canal cervical e a abertura da vagina, contribuindo para o bom andamento do parto, do seu bem-estar, assim como do seu bebê. Conecte-se!

Relaxe e não lute contra as forças que se movem dentro de você. Ao fazer isso, o néo-cortex deixa de comandar e seu cérebro primitivo é acionado, permitindo que você adentre a “partolândia” – a mais pura conexão (um estado alterado de consciência) onde não há espaço para racionalização e sim a oportunidade de se deixar levar pelas contrações uterinas. Aqui, a luz da consciência mais profunda surge, o mais puro saber.

A força da Śakti, da Deusa, que simplesmente acontece. E assim, a mãe traz seu filho ao mundo. Um dica: Mergulhe na contração ao invés de se contrair e lutar contra ela. Como se você surfasse às contrações usando-as ao seu favor.

Você perceberá como o processo se torna mais natural, orgânico e flúido. Cada contração é um esforço do útero em trazer seu bebê ao mundo. Cada contração é uma escolha: vou permitir e me abrir ou vou fugir delas e me retrair?

Vamos praticar?

Vamos aproveitar esses momentos finais e praticarmos juntas a conexão com a força divina que habita dentro de nós: Sente-se confortavelmente, relaxe os ombros e expire colocando para fora toda e qualquer preocupação ou tensões.

E a cada inspiração se concentre neste momento, o AQUI e AGORA. Concentre-se neste PRESENTE de Deus que é o Serzinho que cresce dentro de você e que em breve fará parte de sua família. Pouse sua mãe esquerda em seu coração e a direita em algum ponto de seu ventre.

Ao inspirar se conecte com o amor que existe em seu coração e com todos os bons sentimentos que deseja transmitir ao seu bebê. Ao expirar doe esse amor e seus melhores sentimentos através da sua mão direita.

Visualizando seu amor chegando a placenta, passando pelo cordão umbilical e pousando direto no coração do seu bebê. Se concentre nisso por algumas respirações.

Tente permanecer o mais relaxada possível e começar a praticar o ouvir o que está além, a consciência divina que pulsa dentro de nós. Permaneça em silêncio pelo tempo que quiser, deixando-se se aprofundar mais e mais em direção ao silêncio que existe entre cada pensamento. Aprenda com ele.

Neste ponto a intuição pode ser tornar extremamente forte e presente, ouça. Quando decidir voltar, faça isso aos poucos, mexendo o corpo e abrindo os olhos gradativamente.

Oṁ Lokaḥ Samastaḥ sukhino bhāvantu.
Oṁ śāntiḥ śāntiḥ śāntiḥ. 

॥ हरिः ॐ ॥

Referências bibliográficas e leituras sugeridas:
Balaskas, Janet. Parto Ativo: guia prático para o parto natural. Tradução Adailton Salvatore Meira. São Paulo: Ground, 1993.
Balzano, Cristina e Mukti, Veena. Apostila Digital de Formação em Yoga para Gestantes. GAMA. São Paulo, 2009.
Bertherat, Marie; Bertherat, Thérèse e Brung, Paul. Quando o corpo consente. Tradução de Estela dos Santos Abreu. São Paulo: Martins Fontes, 1997.
Deepak, Chopra. Origens Mágicas, vidas encantadas: um guia holístico para a gravidez e o nascimento. Tradução de Ana Deiró. Rio de Janeiro: Rocco, 2006.
Fadynha. Yoga para gestantes. São Paulo: Ground, 2005
Lad, Vasant. Ayurveda: a ciência da autocura, um guia prático. Tradução de Jurema Maurell. São Paulo: Ground, 2007. Leboyer, Frédérick. Nascer Sorrindo. Tradução Média. São Paulo: Brasiliense, 2004.
Marino, Inês Maria; Dambry, Walkyrua A. Gusti. Ayurveda: o caminho da saúde. São Paulo: Gaia, 2004.
Sparrowe, Linda. O Livro de Yoga e Saúde para a Mulher. Tradução de Carlos Augusto. São Paulo: Pensamento, 2002.
Tolle, Eckhart. O Poder do Silêncio. Tradução de Ana Quintana e Regina da Veiga Pereira. Rio de Janeiro: Sextante, 2005.

॥ हरिः ॐ ॥

Ana Paula Malagueta é Educadora Perinatal, doula voluntária do Amparo Maternal, professora de Yoga pré-natal, pós-parto, baby Yoga e śāntala.

॥ हरिः ॐ ॥

+ sobre Yoga e gravidez aqui e aqui

॥ हरिः ॐ ॥

+ posts
kāma muta

Kāma Mūta: Somos Movidos pelo Amor

Pedro Kupfer em Conheça, Sociedade
  ·   3 minutos de leitura
serpente

O Simbolismo da Serpente no Yoga

Pedro Kupfer em Conheça, Dharma Hindu
  ·   2 minutos de leitura

6 respostas para “O Nascimento da Devī: por uma Gestação Plena”

  1. Olá querida. Sou Mãe de um bebê de 10 meses, doula e educadora perinatal, terapeuta ayurvédica e instrutora de yoga. Amei esse estudo e o seu compartilhar. Maravilhoso. Gostaria de receber textos e artigos sobre essa relação gestação, maternidade yoga e ayurveda. Namastê

  2. Ana Paula, muito lindo o texto! Parabéns pelo trabalho! Namastê! 🙂

  3. Parabéns por este artigo. Estou sugerindo para minhas alunas de yoga que se encontram grávidas.

  4. Ana Paula,
    Adorei seu artigo… quanta paz e esclarecimento! Vc poderia indicar colegas seus que atuem aqui em Goiania?
    Estou grávida de 3 meses, e gostaria muito de encontrar um profissional confiável para Yoga Pré Natal…
    Obrigada, e muita luz sempre!

  5. Olá, Iracelina

    A contração do útero é involuntária, ou seja, nós não temos controle sobre ela. Não podemos mandar o útero contrair ou parar. Mas, podemos sim, nos movimentar e nos colocar em certas e diferentes posições que auxiliem o trabalho de parto.

    Namaste!

  6. Ana Paula,
    Gostaria de saber, na gravidez, a contração do útero no momento do nascimento é uma atividade muscular voluntária?

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *