Āsana, Pratique

Prós e Contras de Fazer ou Receber Ajustes

Receber ajustes sutis de Yoga que aprimoram a postura e expandem nossa compreensão de como construir cada āsana pode oferecer benefícios significativos a qualquer praticante. Esses ajustes têm o potencial de proporcionar uma sensação incrível e facilitar uma compreensão profunda daquilo que uma postura pode nos oferecer, e até onde nosso corpo pode chegar na prática.

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As recomendações que você verá neste texto podem ajudar qualquer praticante a avaliar se seus instrutores e, se for o caso, a melhorar a comunicação com eles para que as práticas possam fluir da maneira mais segura e eficiente.

Igualmente, podem ser úteis para quem dá aulas de Yoga, à guisa de reflexão sobre eventuais melhorias que o professor possa introduzir na sua maneira de ensinar e transmitir o Yoga.

Receber ajustes sutis e eficientes durante a prática de āsana pode aprimorar a execução das posturas e expandir a nossa compreensão de como construir cada uma, além de oferecer benefícios significativos a qualquer praticante.

Esses ajustes têm o potencial de proporcionar uma sensação incrível e facilitar uma compreensão profunda daquilo que uma postura pode nos oferecer, e até onde nosso corpo pode chegar na prática.

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Alguns yogins ficam entusiasmados quando um professor decide ajustar certas posturas nas quais eles possam precisar de ajuda.

No entanto, escolher não ajustar os alunos pode potencialmente trazer outros benefícios para a prática e para a experiência geral na sala de Yoga, como veremos daqui a pouco.

Se você é alguém que valoriza o toque na Yoga, considere que pode não haver unanimidade entre os praticantes e professores em relação a isso, e que você pode vir a encontrar alguma resistência sobre o tema por parte de algumas pessoas. 

Por um lado, o toque tem um poder incrível e, para algumas pessoas, uma aula de Yoga pode ser a única ocasião em que recebem esse tipo de contato. Por outro, pode haver pessoas que não estejam nada confortáveis em relação a serem tocadas, assistidas ou ajustadas.

Assistências e ajustes

Vamos fazer uma distinção: assistências são toques suaves, como pressionar gentilmente os quadris de alguém durante o bālāsana, a postura da criança (com a permissão do praticante, naturalmente).

Já os ajustes são mais focados em aspectos anatômicos e têm a intenção de ajudar o aluno a alcançar o alinhamento adequado para obter os benefícios da postura, mantendo o corpo de forma segura e eficaz.

Embora o toque possa ser curativo e amoroso para muitos, também pode causar ansiedade, violação de espaço pessoal, distração e desconforto para outros.

Essa é uma discussão contínua entre professoras e professores de Yoga, mas nem todos os cursos de formação abordam as diversas maneiras de oferecer ajustes de Yoga, e como identificar se um praticante está ou não confortável com o toque.

Cabe a pergunta: será possível que, em alguns casos, optar por não fazer ajustes seja a escolha mais benéfica?

Motivos para Não Oferecer Ajustes

  1. Respeito pelo Processo de Cada Praticante

Certamente todos queremos que a nossa liberdade seja respeitada e levada em conta, não é? No entanto, ao fazer um ajuste, o instrutor tira a escolha do praticante sobre como ele deveria fazer os āsanas.

Quando os praticantes têm espaço para explorar por si mesmos, começam a trabalhar a parte mais importante: a psiquê (pensamentos e emoções) e a interocepção, que é a sensibilidade para saber como o corpo está, como ele se move no espaço e de que forma as emoções se movem no seu interior.

Os praticantes também devem ter liberdade para decidir sobre o como e o quando desejam experimentar uma postura nova. Pode ser frustrante quando alguém decide em seu lugar quanto tempo você deve permanecer em uma postura e quais āsanas você pode ou não deve fazer.

No afã de que os alunos “compreendam” a prática, às vezes o professor acaba por forçá-los, impondo o seu próprio ritmo à compreensão deles. Nesse sentido, oferecer ajustes verbais verdadeiramente eficazes, claros e amorosos pode ser mais benéfico do que fazer ajustes manuais.

Aceitar que um aluno pode não entender ou optar por não ir demasiado profundamente nos āsanas também ajudará o instrutor a crescer. Cada pessoa aprende em seu próprio ritmo, e respeitar isso realmente auxiliará o progresso de cada um.

  1. Não Todo o Mundo Gosta de Ser Tocado

Como humanos, às vezes fazemos suposições, mas nem sempre acertamos. Quando o instrutor não assume que todos os alunos estão confortáveis com o toque, ele capacita cada um a tomar suas próprias decisões.

Sabendo disso, alguns professores tomaram a decisão de utilizar cartões de consentimento na sala de práticas, permitindo que os alunos comuniquem claramente se desejam ou não receber algum tipo de toque durante as aulas.

Na dúvida, cabe sempre ao instrutor se ele achar que há uma razão convincente para oferecer um ajuste. Isso ajudará a evitar julgamentos precipitados que possam levar as pessoas a situações que são, potencialmente, desconfortáveis.

Por exemplo, algumas pessoas podem não se importar com o toque em geral, mas podem ter restrições pontuais em relação a partes específicas do corpo. Eu, por exemplo, não gosto de receber ajustes que possam tirar a estabilidade da minha combalida região lombar.

  1. Foco na Segurança dos Praticantes

A única maneira que o professor de Yoga tem de adquirir conhecimento é praticar e aprofundar nos estudos e treinos, mas isso leva tempo. Professores novatos podem sentir-se pressionados para oferecer ajustes nos āsanas, mas é importante questionar o quão oportuno e eficiente isso realmente é, quando a pessoa que realiza o toque não se sente 100% confortável em ajustar.

Infelizmente, muitas pessoas têm histórias de lesões que surgem quando um professor de Yoga bem-intencionado mas pouco sensível ou agressivo ao realizar um ajuste. Perguntar, pedir permissão e consentimento para fazer o toque é essencial.

Para qualquer instrutor ou instrutora de Yoga, manter os praticantes seguros deveria ser a prioridade máxima. Optar por não fazer um ajuste de Yoga quando a pessoa não tem certeza absoluta de como fazê-lo corretamente é sempre a escolha mais segura e responsável.

  1. O Toque Deve ser Inequivocamente Claro

Você já recebeu um ajuste sem entender a intenção do instrutor, ou que não pareceu muito útil ou necessário? Eu já, e provavelmente você também. 

Os ajustes devem ter (e fazer) sentido. Apesar de o toque oportuno ser ótimo, também pode distrair e tirar o yogin da experiência de estar atento(a) no seu próprio corpo. 

Se o professor optar por fazer um ajuste, é essencial que os praticantes tenham certeza sobre a intenção com a qual ele faz esse toque. Em muitos casos, para deixar clara essa intenção, o ajuste físico deveria ser acompanhado por instruções verbais. 

  1. Cuidado com os Egos dos Praticantes

O ego é uma ferramenta psíquica que envolve a percepção e imagem que temos de nós mesmos. Ele está constituído por crenças, desejos, emoções e da ideia que temos sobre quem somos. De modo geral, o ego é uma estrutura assaz frágil.

Ao receber um ajuste, um praticante pode interpretar a sua iniciativa como uma correção por ter feito algo errado. Isso pode levar a interpretar o ajuste como uma ofensa. A suscetibilidade e fragilidade emocional de cada pessoa deveriam ser tomadas em conta dentro da sala.

Nesse sentido, é importante que o instrutor seja sensível para evitar magoar alguém, seja com toques, seja com palavras, pois seus gestos podem ser percebidos como ofensivos ou prejudiciais. 

Algumas pessoas, ao começar, vão sentir-se inseguras pela falta de experiência ou até mesmo entrar em pânico só de pensar em frequentar as prática, expor seus corpos ou sentir-se observadas. 

O professor de Yoga precisa tomar cuidado com isso e dar aos praticantes um generoso espaço para que eles descubram as coisas por si mesmos. Também precisa dizer ou demonstrar para eles que não há nada de errado com o fato de não terem experiência prévia com Yoga. 

Se um praticante sair da sala sentindo-se criticado ou envergonhado, é altamente improvável que retorne. Esse tema pode tanto afetar praticantes iniciantes quanto muito experientes.

Como dizia o nosso mestre, Swāmi Dayānanda, se a pessoa quiser apontar continuamente para os erros dos demais, deveria trabalhar como corretor ortográfico. 

Se um praticante está contente com o esforço realizado, mas o professor fica marcando e apontando para pormenores minúsculos, o resultado pode ser o inverso do pretendido. 

Ajustar ou não ajustar?

Este é o grande ponto de discussão: aplicar ou não estes recursos? Em algum momento, todos chegamos numa situação na qual será necessário recebermos algum ajuste.

Se uma pessoa estiver fazendo algo potencialmente perigoso, é responsabilidade do facilitador(a) intervir gentilmente, porém com firmeza, para fazer ela entender que pode lesionar-se e como evitar essa potencial lesão.

Quando o professor de Yoga opta por não fazer ajustes, por outro lado, pode ajudar os alunos a sentir-se bem e aceitar da melhor maneira os corpos deles.

O não-toque pode aumentar a autoestima e reforçar a mensagem de que o corpo do(a) praticante não tem nada de errado.

O não-toque pode validar as escolhas que os praticantes fizeram em relação ao aprendizado e ao(à) instrutor(a).

Em suma, os instrutores deveriam dar aulas usando os ajustes como exceção e não como regra, apenas para evitar lesões ou desgastes articulares. E sempre, sempre, respeitar o livre arbítrio de cada praticante.

Mas, se Você Insiste…

Ajustes: o que Fazer e o que Evitar?

Um ajuste prático bem executado pode ser um presente incrível e transformador durante uma prática de Yoga. Ele nos auxilia a acessar um āsana que talvez não pudéssemos alcançar de outra forma.

Ao mesmo tempo, aprofunda nossa experiência com o āsana e adiciona um toque especial ao nosso processo de autodescoberta.

No entanto, a questão de oferecer ou não ajustes práticos em uma aula de Yoga é um tema de discussão constante entre os professores.

No entanto, cabe considerar que alguns alunos estão abertos a receber esse tipo de assistência durante as práticas, enquanto que outros não se sentem confortáveis em serem tocados ou podem considerar certos ajustes como algo inadequado, intrusivo ou fora de lugar. 

Além disso, sempre existe o risco de lesões se permitirmos que os alunos façam as coisas por conta própria, sem supervisão, ou se fornecermos um ajuste incorreto. Portanto, é essencial saber quando e como utilizar um ajuste prático em sua aula de Yoga.

Deixamos aqui algumas diretrizes que podem ser levadas em consideração.

Em primeiro lugar, não assustar os praticantes

    Para começar com algo simples, porém básico, os professores de Yoga deveriam evitar sobressaltar ou assustar os praticantes ao tocá-los, especialmente quando eles estiverem de olhos fechados e concentrados.

    1. Alinhamento “Perfeito” ou Respeito pela Singularidade dos Corpos?

    O professor de Yoga precisa ser sensível o suficiente como para reconhecer se é necessário oferecer um ajuste a uma pessoa determinada. Fornecer um ajuste prático apenas para colocar os corpos na postura perfeitamente alinhada pode ser contraproducente e até perigoso.

    Os seres humanos temos todos corpos diferentes, com tamanhos diversos e estilos de vida que determinam características peculiares, o que significa que cada um deles terá uma aparência única em cada postura.

    Cada corpo é tão singular que não pode nem deve ser limitado a uma única forma que o professor julgue como sendo “a correta”.

    A postura do cão que olha para baixo, adhomukha śvānāsana, não parecerá a mesma em todos os corpos. O mesmo vale para a sequência do guerreiros (vīrabhadrāsanas), a postura do triângulo  (trikoṇāsana), o uttanāsana e todas as demais.

    Antes de decidir se devo oferecer assistência prática a um aluno, gosto de pensar se essa assistência realmente os ajudará, e de que forma.

    Se percebo que há força, estrutura e espaço para que alguém faça uma postura de maneira natural, ou se acredito que um ajuste pode ajudar a pessoa a aprofundar a respiração e a experiência no āsana, vou enfrente. 

    Por outro lado, se percebo que o ajuste não fará muita diferença ou poderá desencorajar a pessoa, deixo passar. Prefiro permitir que cada praticante chegue à posição e descubra por si mesmo o que funciona para eles, incentivando-os a continuar respirando e a observar as sensações em diferentes partes do corpo.

    1. Saber o que se Faz

    Isso pode parecer óbvio, mas, na prática, nem sempre acontece. Quando um professor de Yoga se aproxima de um aluno para realizar um ajuste prático, é crucial saber exatamente onde suas mãos irão tocar esse corpo e o que farão.

    O instrutor precisa demonstrar confiança e segurança. Caso contrário, é melhor abster-se. Se o professor não tiver certeza do que está fazendo, os alunos perceberão. Ninguém deseja isso: os alunos precisam sentir que podem confiar no seu orientador.

    1. Priorizar a Segurança

    Infelizmente, há muitas histórias de pessoas que se lesionaram por cause de que um professor de Yoga bem-intencionado foi longe demais num ajuste. Priorizar a segurança dos alunos deve ser a principal preocupação, e, às vezes, a melhor maneira de fazer isso é não realizar nenhum ajuste.

    1. Pedir Consentimento

    Antes de fazer um ajuste prático em um aluno, o professor de Yoga precisa certificar-se de que ele esteja confortável com isso. o instrutor não pode assumir que todo o mundo concorda ou gosta de ser tocado. É essencial obter o consentimento dos alunos em primeiro lugar. 

    Aprendi isto praticando na Índia e aplico sempre: ao apresentar-me para uma prática, digo aos yogins que, eventualmente, posso vir a usar ajustes práticos para ajudá-los a aprofundar uma postura ou recuar, se necessário.

    Peço que eles me informem se tiverem alguma objeção e, já durante a prática, pergunto novamente se posso tocar no corpo da pessoa antes de proceder.

    Especialmente, se ela estiver de costas para mim ou com o rosto voltado para baixo, de maneira que não veja que estou aproximando-me.

    Uma ótima maneira de obter consentimento, já usada em muitas escolas e estúdios, é fornecer cartões de consentimento aos alunos, para que eles possam indicar se estão receptivos para serem ajustados ou não.

    1. Avise antes de Tocar a Pessoa

    Portanto, antes de fazer um ajuste prático em um aluno, o instrutor precisa avisar sobre a sua presença para evitar surpreendê-lo, especialmente quando estiverem de olhos fechados e concentrados. O professor de Yoga deve certificar-se de que os praticantes saibam onde ele está, antes de tocá-los.

    Isso é especialmente importante se o instrutor for fazer algum ajuste durante a prática de yoganidrā, com a pessoa deitada e de olhos fechados.

    1. Às vezes, um pequeno gesto é suficiente

    Se o professor de Yoga deseja ajustar a postura de um aluno, às vezes tudo o que precisa fazer é tocar em uma área específica ou simplesmente apontar na direção correta, em vez de usar as mãos para realizar o ajuste completo.

    Isso pode ser suficiente para que os praticantes percebam que devem prestar atenção a uma determinada parte do corpo ou ativar um músculo específico. 

    Por exemplo, o professor pode ajudar um aluno a aprofundar uma postura de torção apenas apontando o dedo indicador para cima, para lembrá-lo de tracionar a coluna vertebral, ou tocando suavemente sobre um ombro para incentivá-lo a fazer uma rotação externa.

    1. Reconheça eventuais resistências

    Ao realizar ajustes práticos em aulas de Yoga, as mãos do instrutor precisam ser extremamente sensíveis. Ele deve ser capaz de identificar qualquer sinal de resistência com o tato das pontas dos dedos. A resistência pode ser tangível ou sutil e, em todos os casos, ela deve ser levada em consideração. 

    Em qualquer caso, se o professor perceber rigidez, deveria incentivar o yogin a respirar profundamente. A própria exalação profunda ajudará a aprofundar a postura. Se isso não funcionar, é melhor permitir que o aluno continue na posição em que está.

    1. Pedir Feedback

    Como dissemos acima, sempre que fizer um ajuste prático, o instrutor deve certificar-se de que o toque seja útil, claro e confortável para o praticante. Ocasionalmente, caso alguém se sinta desconfortável com um ajuste, deve sentir que há espaço para mencionar o tema. Isso possibilita o feedback, que é fundamental para que a relação professor-praticante seja fluida, de mútua confiança, e possibilite o crescimento interior de ambos.

    Assim, perguntas simples como “está tudo bem?” ou “como você se sente?” ajudarão o instrutor a compreender como estão os praticantes. Dessa forma, ele também os incentivará a expressar suas preferências em relação aos ajustes antes mesmo de formular alguma pergunta.

    Ao ensinar uma postura de Yoga em uma aula, haverá momentos em que o instrutor poderá sentir vontade de ajustar a posição de um aluno. Antes de se aproximar e tocá-lo, reserve um momento para refletir sobre como esse ajuste planejado será verdadeiramente útil para ele. Use sua intuição. 

    O professor de Yoga deve sempre saber o que está fazendo e colocar, como falamos antes, a segurança dos alunos como sua principal prioridade e lembrar que, o mais importante é que a jornada no Yoga de cada pessoa é única.

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    Leia também:
    Ajustes: Quem Precisa Deles?

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    Se quiser conhecer a relação entre ajustes e abusos sexuais, 
    eis aqui um artigo sobre o tema do New York Times: 
    Yoga Is Finally Facing Consent and Unwanted Touch

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    Pedro nasceu no Uruguai, 58 anos atrás. Conheceu o Yoga na adolescência e pratica desde então. Aprecia o o Yoga mais como uma visão do mundo que inclui um estilo de vida, do que uma simples prática. Escreveu e traduziu 10 livros sobre Yoga, além de editar as revistas Yoga Journal e Cadernos de Yoga e o site yoga.pro.br. Para continuar seu aprendizado, visita à Índia regularmente há mais de três décadas.
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