Nova edição da Haṭhayoga Pradīpikā.
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Esta edição da Pradīpikā é copyfree. Isto quer dizer que a presente obra é gratuita e pode ser reproduzida, porém não alterada. Tanto o texto sânscrito original como as imagens que ilustram esta edição estão no domínio público. Como editores e tradutores, abdicamos de quaisquer direitos autorais: este livro é a nossa oferenda à comunidade do Yoga.
Portanto, fique à vontade para duplicar, imprimir, divulgar, compartilhar com seus amigos e desfrutar livremente destes ensinamentos. Também podem ser feitas citações de trechos desta publicação em outros livros e órgãos de imprensa, desde que seja mencionada a fonte. Obrigado e boas práticas!
Introdução à Haṭhayoga Pradīpikā
Temos o prazer de apresentar à família dos yogins lusófonos uma nova edição da Haṭhayoga Pradīpikā, guia clássico para a prática de Haṭhayoga, que aparece aqui em uma das suas formas mais antigas. A importância desta obra deve-se ao fato dela ser o manual mais detalhado sobre a ciência do Haṭha que chegou até nós.
Pradīpikā significa “elevada luz”, mas também quer dizer “explicação”, “comentário”. O prefixo pra denota elevação, preenchimento, grandeza. Dīpikā é a luz de uma lamparina. Haṭhayoga Pradīpikā é, então, a explicação sobre os métodos que o Haṭhayoga utiliza para revelar ao praticante que ele já é a libertação que procura. O nome pode ser traduzido como “Clara Luz sobre o Haṭhayoga”. Essa libertação, chamada mokṣa, é a grande meta de todas as formas de Yoga.
Svātmārāma, o autor, parece ter vivido por volta do século XV de nossa era. O nome Svātmārāma significa “aquele que encontra a graça no Ser que é (Ātma)”. Ele expõe aqui as disciplinas fisiológicas e vitais que fizeram célebre o Haṭhayoga, integradas junto com as práticas contemplativas do Rājayoga.
Faz isso deixando claro, logo no início do ensinamento que o conhecimento do Haṭhayoga, haṭhayogavidyā, “como uma escada, conduz ao elevado Rājayoga”.
O Haṭha é uma forma de Yoga com raízes na Índia antiga mas que ganhou muita força no período medieval, entre os séculos IX e XVI desta era. Como todas as demais manifestações do Yoga, tem um único objetivo: mokṣa, a liberdade.
Essa libertação é um processo cognitivo que consiste apenas em reconhecer a si mesmo como alguém livre de limitações. O estilo de vida, os valores e demais temas estão sempre em função dessa meta essencial.
A peculiaridade do Haṭha é que busca essa liberdade através de uma série de práticas e reflexões que visam ao despertar da potencialidade humana, chamada kuṇḍaliṇī.
Esse despertar acontece através de um esforço, que não deve interpretar-se no sentido físico: trata-se de um esforço no sentido do autoconhecimento, uma reflexão feita tendo como base o corpo e a vitalidade, mas que acontece no sentido de compreender a própria natureza, que transcende as esferas física, vital e psíquica.
Segundo a Gorakṣaṣaṭaka, uma obra contemporânea da Pradīpikā, a palavra haṭha, que literalmente significa “grande esforço”, deriva das sílabas ha, sol, e ṭha, lua. Nessa palavra, portanto, está implícita a visão do Tantra, que finca as suas raízes na ancestral tradição não-dual dos Vedas.
A integração das forças solar e lunar, a transcendência da identificação com todos os pares de opostos, condição prévia para o despertar da potencialidade humana, é o objetivo deste Yoga.
O período em que o Haṭha surgiu coincide com um momento muito especial da história, em que os adeptos do Tantra apresentaram a uma Índia pasmada e acomodada no ritualismo bramânico uma visão revolucionária e dinâmica do universo e do homem.
Para os tántricos o corpo não é mais a causa do sofrimento ou da perdição, mas um veículo para a transcendência e a realização da natureza divinal no homem. O Kulārnava Tantra (I:18) deixa isso bem claro:
Sem o corpo, como realizar o [supremo] objetivo?
Então, depois de adquirir uma morada corpórea,
a pessoa deve realizar ações meritórias, pūṇyam.
A Śiva Saṁhitā (II:1-5) reafirma a mesma visão:
Neste corpo, o monte Meru [a coluna vertebral] está rodeado
por sete ilhas: há rios, mares, campos e senhores dos campos.
Há e sábios, e nele estão todas as estrelas e planetas.
Há peregrinações sagradas, templos e deidades nos templos.
O sol e a lua, agentes da criação e da destruição, movem-se nele.
O espaço, o ar, o fogo, a água e a terra também se encontram aqui.
Todos os seres que existem no mundo estão igualmente no corpo.
Rodeando o monte Meru, fazem suas tarefas.
Aquele que sabe disto é um yogin, sem dúvida.
O Haṭhayoga dá muita importância à prática das posturas psicofísicas, āsanas, aos respiratórios para expansão da força vital, prāṇāyāmas, bem como às purificações, chamadas ṣaṭkarmas.
A aparição deste método vincula-se a Gorakṣanātha, o mítico asceta fundador da ordem dos Kānphata yogins e autor dos tratados Haṭhayoga (hoje perdido) e Gorakṣaṣaṭaka.
As principais obras sobre esta disciplina, afora as já citadas, são a Haṭhayoga Pradīpikā, segundo a tradição, baseado num texto prévio chamado Haṭhayoga, de Śrī Gorakṣanātha, a Gheraṇḍha Saṁhitā, o Yoga Yājñavalkya e a Śiva Saṁhitā, sendo este último o mais extenso e elaborado do ponto de vista filosófico.
Para a presente tradução da Haṭhayoga Pradīpikā usamos, além da forma original sânscrita, as seguintes fontes de consulta: uma tradução para o inglês editada por K. Kuñjunni Rāja (Adyar Library and Research Centre, Madras, 1972), uma tradução para o francês de Swāmi Muktibodhānanda e comentada por Swāmi Satyānanda Saraswati (Éditions Satyānandāśram, Paris, 1991), uma edição facsimilar da tradução feita em 1915 por Pañcam Siṅgh (Munshrirām Manoharlal, New Delhi, 1997), e uma tradução para o inglês, feita e comentada por Swāmi Vishnudevānanda (Motilal Banarsidass Publishers, New Delhi, 1992).
Esta é a terceira tradução feita para o português. A primeira, de autoria do professor Caio Miranda e editada pela Freitas Bastos em 1966, é impossível de achar-se atualmente. A segunda foi feita por Gregório José Pereira de Queiroz e publicada sob o nome Haṭha Yoga e o Comportamento na Vida, pela editora Pensamento em 1985. Justifica-se esta nova tradução, dado que as anteriores encontram-se esgotadas.
Estrutura e temas da Haṭhayoga Pradīpikā.
A Haṭhayoga Pradīpikā consta de quatro capítulos, somando um total de 389 versos duplos octossilábicos chamados ślokas, embora este número possa oscilar, dependendo da edição.
Neles, o yogin Svātmārāma proporciona-nos definições fundamentais sobre algumas técnicas absolutamente essenciais para o progresso na prática do Yoga. Vejamos um breve resumo.
No primeiro capítulo, depois do código de conduta, que possui vinte elementos, são descritos sucintamente quinze āsanas. Para desilusão de alguns entusiastas da prática meramente física, a maioria dos exercícios descritos nesta obra é variação da postura sentada com as pernas cruzadas.
E para aqueles que estão acostumados com a ideia de que Haṭhayoga é sinônimo de prática física suave e relaxante, a brevidade da série de āsanas descrita, aliada ao grau de dificuldade das demais posturas “fisioculturistas” propostas pelo autor, como kukkuṭāsana ou mayūrāsana, pode resultar duplamente frustrante.
Digo isto porque, se por um lado, alguns dos āsanas descritos não são de fácil execução, por outro, não é dada tanta importância à sua prática como acontece nos dias de hoje, já que esta aparece claramente em função do objetivo final deste sistema: a libertação, mokṣa.
O restante da obra, com sua carga de práticas energéticas e meditativas, encarrega-se de enterrar o mito de que o Haṭhayoga seria apenas “Yoga físico”. Neste primeiro capítulo, são dadas ainda instruções sobre a dieta correta que o praticante deve seguir.
No segundo capítulo expõe-se a ciência do prāṇāyāma, as técnicas de expansão da força vital (prāṇa). Para aqueles praticantes com problemas de saúde, são prescritas ainda as “seis ações” (ṣaṭkarma) de desintoxicação do organismo.
Estas técnicas purificadoras devem ser praticadas antes do prāṇāyāma. Ainda no segundo capítulo, o autor distingue oito tipos de prāṇāyāma, que ele denomina kūṁbhakas ou retenções. Afirma que estas retenções despertam o potencial psíquico latente no ser humano, chamado, nos textos esotéricos, de poder serpentino, kuṇḍaliṇī śaktī.
O processo do despertar dessa energia potencial está exposto no terceiro capítulo e é complementado por dez “selos” corpóreos chamados mudrās e ainda por três ativações energéticas chamadas bandhas, que são feitas na região da garganta, do ventre e do assoalho pélvico.
Este capítulo é concluído por uma descrição das técnicas vajrolī e sahajolī, de sublimação dos fluidos sexuais que fazem parte das práticas de transmutação da energia sexual, característica da alquimia tántrica.
Cabe destacar que estas técnicas, descritas nos ślokas 83 a 102, foram sistematicamente censuradas e eliminadas em várias das edições que consultamos para esta tradução, tanto indianas como ocidentais.
A justificativa dos editores é sempre a mesma: trata-se de “práticas imorais”, que seriam inadequadas para yogins em busca da libertação. Consideramos que, como tradutores, não nos cabe censurar, nem decidir o que o leitor pode ou não deve ler.
O capítulo final discorre sobre as técnicas de percepção do nāḍa, o som sutil que se torna audível quando a rede de canais energéticos, nāḍīs, foi devidamente purificada. São ainda descritas a reabsorção final, lāyā, que é a compreensão da própria natureza, e as diferentes experiências da profunda absorção, samādhi.
Quanto à estrutura do texto que apresentamos aqui, cabe dizer que acrescentamos, ao longo da tradução, alguns elementos de reconstituição e comentários, que aparecem entre colchetes, para facilitar a compreensão de passagens menos claras.
Achamos igualmente importante a inclusão de um índice remissivo de termos técnicos no final da obra, onde podem ser encontrados detalhes sobre as palavras sânscritas que aparecem nela para ajudar a contextualizar a leitura.
Acrescentamos também uma breve seção sobre fonética sânscrita, bem como uma bibliografia para quem quiser aprofundar seus estudos.
É nosso desejo que o leitor seja estimulado pelo eco das vozes dos yogins da antiguidade, que são claramente ouvidas neste texto, e pelo altíssimo valor instrumental das instruções aqui contidas, para aceitar o convite de aventurar-se a navegar no Oceano da Consciência.
Este livro tem, assim, a pretensão de servir como manual de referência para a compreensão e a prática do Haṭhayoga. Porém, é necessário lembrar o leitor não deve tentar fazer os exercícios aqui descritos sem a orientação de um professor responsável e devidamente qualificado.
Assim, sugerimos estudar com atenção e cuidado as práticas que o sábio Svātmārāma nos sugere, mas também procurar a ajuda de um instrutor competente para praticar em segurança, pois está claro que muitas destas práticas não são para iniciantes e revestem riscos se forem feitas sem um acompanhamento adequado nem a compreensão cabal das descrições, que nem sempre são claras.
Fica aqui a nossa oferenda para as novas gerações de praticantes, com o desejo de que possam desfrutar e beneficiar-se da profundidade e capacidade transformadora da nossa bela tradição.
Assim, despedimo-nos aqui, desejando ao amigo leitor que receba os melhores frutos das práticas e do inspirador processo de crescimento e descoberta interior que é o Yoga. Paz, luz e felicidade.
Hariḥ Oṁ.
Veja aqui uma tradução comentada da Haṭhayoga Pradīpikā para o inglês por Pañcham Singh.
Muito obrigada por disponibilizar o material! Parabéns.
gratidão wagner xavier
Grata Pedro e Ângela, pelos ensinamentos e acréscimo na nossa caminhada!
grata teacher! tenho algumas duvidas,mas estou anotando todas para em breve esclarecer.
agradeço a obra em pdf ! Compartilharei com amigos praticantes de yoga, de Goiania!
Muito obrigado!
Namastê
Espero, há muito tempo, este gesto de gratidão. Para que todos possam entender, o que seja essa grandeza chamada de União com o Divino.
olá Pedro Kupfer, primeiramente muito obrigada pelo compartilhamento desta obra. Essa versão está excelente, muito organizada e as ilustrações ajudam muito.
Gostaria de tirar uma dúvida: em uma tradução sua anterior a essa, nos artigos sobre ásanas. Especificamente I:37 Siddhásana, estava escrito o calcanhar esquerdo no períneo e o direito por cima. Na versão atual, está o calcanhar direito no períneo e o esquerdo por cima.
Qual é o correto?
Essa questão de polaridade costuma ser confusa dependendo da linha que está sendo estudada. Eu havia convencionado o calcanhar esquerdo, conforme versão anterior, por conta da polaridade negativa deste e da kundalini.
Grata!
Namastê
Muito obrigado! Namaste.