Esforço máximo. Desde pequena escuto que posso chegar onde quiser. Não existem limites para o exercício da vontade. E hoje, quem não se mata é preguiçoso. Quem não trabalha desvairadamente até adoeçer é pessoa mole. Quem dorme oito horas, quem toma café com calma e quem deixa a vida rolar é, no mínimo, um ser despreocupado, quase irresponsável.
Difícil mesmo é saber qual é o máximo do máximo. Qual é a dedicação adequada, a força adequada e melhor ainda, a vontade adequada? Adequado seria aqui aquilo que nos cabe, agora, do jeito que somos? Um adequado saudável, enrriqueicido com moderação.
Educação para ser super herói de cidade desconecta a pessoa da noção de medida. Medida de cidade não tem medida. Não tem pausa. Não tem silêncio. Não tem satisfação nem relaxamento. Tudo pode e deve ser melhor melhor e melhor. Melhor até não ter mais saúde. Melhor até cair e ter que rever o valor de tudo.
Dar o máximo todos os dias transforma a vida em um fardo. Dar o máximo além do máximo faz da vida uma guerra, uma competição contínua consigo mesmo. Uma necessidade de superação constante. Um não cessar constante até o tacar da sirene.
Esse máximo faminto tem como motor o monstro do medo. Parar é quase morrer. O agir frenético é a tentaiva de controlar cada segundo, cada respiração, cada pensamento alheio, cada opinião e cada pingo de chuva, que deve cair sempre na medida certa. O que fazer com os segundos desocupados? O que fazer com a dúvida? O que fazer com o não saber no que vai dar?
Em cidade grande assim a gente se perde. Entra num ritmo que arde. O mundo dos ex-humanos tem uma maré que arrasta. Tem um excesso que entope a alma. O dia dura 24 horas. Ninguém fecha. Ninguém chega em casa cedo. E casa, é cada vez mais cama. Só serve para pra dormir. Final de semana é para aproveitar, com tudo que significa hoje em dia, diversão.
Tudo no máximo. Um dia de sol não pode passar em branco. A vida está aí para ser pintada e nos foi ensinado a rabiscar tudo o tempo todo. O buraco em branco é angustiante. O não-aproveitar é depressão aos olhos dos outros e aos seus próprios olhos construidos. Olhos de televisão, revista e outdoor.
E isso tudo a gente só percebe quando sai, quando vai para um lugar bem mais calmo. Ou quando alguém do nosso lado ou nós mesmos caímos na cama doentes. Ou então quando começamos a ficar estressados e agressivos.
Então procuramos yoga, análise ou qualquer coisa parecida. E desejamos ardentemente que tudo se resolva ali, naquela hora massacradamente conquistada para dedicar ao cuidado de si. Yoga tem que mostrar efeitos rápidos. E assim seguimos tomando aspirina todos os dias. O dia a dia parece imutável.
Frear o movimento de perseguição da vida boa parece absurdo. A vida boa será sempre um dia, nunca agora, nunca amanhã, logo pela manhã, quando eu resolver que vou diminuir a carga horária de trabalho pra pelo menos poder mastigar na hora do almoço. E quando me perguntarem como vai a vida, vou dizer delicadamente que finalmente parei de me orgulhar de meu suicídio diário.
E que finalmente percebi que não há o que temer, o mundo não vai acabar e nunca, jamais vou agradar todo mundo. As respostas dos outros aos meus atos é incontrolável. As minhas respostas aos atos dos outros sim, posso mudar.
Ansiedade, estresse e agressividade a gente não cura tomando ervas ou fazendo yoga quando dá.
Aquele papo de que tudo está dentro de nós é a mais pura verdade. Mas não adianta ficar apenas dentro. Você pode até tentar se adaptar ao máximo exigido e assim conseguir ser mais feliz, ou talvez, eficiente como uma máquina. Mas ainda assim penso que adaptação sem noção de moderação é roubo consigo mesmo. É passar a perna nas próprias pernas.
Mudar por dentro, refletir, ponderar e parar. Tranquilizar a vida. Desacelerar o relógio. Fazer as pazes consigo, escutando os sinais do corpo e daquelas olheiras que gritam bem debaixo dos nossos olhos. Saber os limites, os seus limites. Reconhecer a diferença entre preguiça e exaustão. A diferença entre cuidado e controle. Entre eficiência e mecanismo de sobrevivência.
Olhar para o outro e deixar que o outro seja. Olhar para todos os outros, e deixar que eles sejam. Olhar para o amor e deixar que ele voe, solto e leve. Sem cobrar, sem fazer contas, sem pedir o pagamento esperado no final do mês, da quantidade de carinho que deveríamos ter recebido e de tudo que o outro deveria ter feito.
Mudar por dentro sim, mas só se for pra mudar por fora também. Mudando os alimentos que nos compõem, os ritmos que nos levam e os valores que nos movem. Não o outro, não mais tentativa de controle do mundo. Mudar aqui quer dizer elevar-se acima de si e resgatar-se. Voltar ao eixo, ao centro lúcido.
Existe um lugar logo acima de nós mesmos que aponta a medida e reconheçe os excessos. Que sabe o que é necessário e o que é esforço inútil. Existe esse lugar, está aqui, basta fechar os olhos e conferir.
Realmente precisamos olhar mais para o nosso interior, pois, só assim poderemos resgatar a nossa verdadeira essência. Infelizmente, são poucos os que têm a percepção da verdade, ou seja, aqueles que possuem a sensibilidade para reconhecer que esse estilo moderno de vida é insano e nos afasta cada vez mais de nós mesmos.
Infelizmente, isso é cultural. Desde criança fomos programados para sermos o nº 1 em tudo e isso, inconscientemente é passado de pai para filho, mostrando o egocentrismo que o ser humano possui. E pergunto para vocês: E o medo de colocar o peito ou dar a “cara” a tapa para mudar? E o medo da solidão? Perguntas que racionalmente são fáceis de serem respondidas, mas na prática , as soluções são muito mais complexas.
Não são todas as pessoas que estão preparadas para escutar a verdade. Algumas sabem, mas preferem viver na mentira, pois é menos trabalhoso se encarar e enxergar a pobreza do espírito. Acredito que esses sim são os verdadeiros hipócritas.
Nesse modelo de vida, temos que trabalhar arduamente para podermos comer, sustentar uma famíla, uma moradia, pagarmos impostos, etc, ou seja, é claro que temos que ter um tempo para nós mesmos, mas não culpo aqueles que sol a sol labutam para sobreviver e por infelicidade não conseguem a “regalia” de fazer uma atividade para si. Adorei o texto, mas a prática é bem diferente. Cada ser humano possui o seu Karma e a sua realidade, se tomassemos todos os seres como sendo iguais, tendo os mesmos direitos, as mesmas condições, estaria em pleno acordo com todas as suas maravilhosas palavras, porém para muitos o tempo não pode parar!
Namastê! Om Shanti!
Joan Pablo Francesch.
Adorei o artigo da Manuela. Acho que este artigo vai fundo em pontos que não nos damos mais conta nos dias de hoje. Estamos sempre atrasados, com pressa e querendo ganhar mais. Na maioria das vezes perdemos o foco daquilo que nos move de verdade, pois somos conduzidos apenas pelo medo ou pelo automatismo. O yoga tem me ajudado a olhar mais profundamente para mim mesmo e encontrar o real valor da vida, que na verdade se encontra em mim mesmo, tem me ajudado a escutar a minha musica interior e esquecer um pouco dos ruidos externos. Obrigado Manuela pelo excelente artigo. Parabens.
Sábias palavras. Não é dificil de identificarmos nossas vidas nessa loucura a qual vivemos, e aí é que mora o perigo, na identificação do mundo… Parabéns Manu pelo sábio texto.