Pratique, Yoga na Vida

Começando pelo chão

Aula de yoga não é aspirina. É um aprendizado que precisa de começo e de desenvolvimento para um fim bem desenhado. Bem localizado, nítido. Sem isso ficamos soltos. A cada dia provando uma coisinha a mais. Vira degustação de yoga

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Já faz tempo que não escrevo nada. A mente às vezes entope com coisas demais ou nubla num pane torpe sem criatividade. E quando enguiça só o tempo concerta…

Mas venho hoje retomar um assunto importante e que tem preenchido os meus dias. Um começo é necessário. Uma ordem coerente, um ponto de referência, um sentido pra tudo isso que fazemos. Especificamente em aulas de Yoga, já me cansa improvisar.

Já me cansa pegar no meu baú abarrotado, como um google em pesquisa, alguma coisa que se aplique ali, para aquelas pessoas naquele lugar. Sempre imaginando, tentando ver, já que quase não dá tempo de realmente conhecer as pessoas e seus corpos. Improvisar é preciso, mas sempre não dá.

No meu baú tá tudo certo. Tenho ali um monte de coisas que posso usar para mim mesma. Mas no ensino, como ajudar o outro a usar o que aprende? Como organizar para o outro? Um começo se faz necessário. Uma base, um princípio. Um chão. E não um monte de penduricalhos no ar.

Aula de Yoga não é uma coisa a cada dia. Aula de Yoga não é aspirina. É um aprendizado que precisa de começo e de desenvolvimento para um fim bem desenhado. Bem localizado, nítido. Sem isso ficamos soltos. A cada dia provando uma coisinha a mais. Vira degustação de Yoga.

Prova-se de tudo mas entende-se quase nada. Provar é necessário. Mas é preciso um roteiro até mesmo para a experimentação. A base é chão que se leva para qualquer sala de qualquer método de Hatha Yoga. É base. E a base do Yoga é um jeito de olhar que faz toda a diferença.

Nos dias de hoje, com essa mania de leve “mais pague menos” e “tudo para sua comodidade”. Compramos um pacotão com um pouco de tudo, compramos a entrada na mega academia que ofereçe mais aulas por hora e superultra equipamentos de última geração. Até aqui ótimo.

O problema aparece quando a gente resolve pipocar nas aulas. Ir de vez em quando. Fazer a aula do fulano porque relaxa, a do ciclano de vez em quando pra suar mais, musculação quando der na telha e tiver saco e spinning quando precisar emagrecer. E por aí vai. Faz-se de tudo e quase nada realmente.

Numa aula de Yoga as informações se acrescentam e completam a cada dia. Mas a turma muda a cada semana e cada aula é um eterno recomeço. Não existe nada mais desgastante para um professor do que o eterno recomeço diário. Diário! De tempos em tempos tudo bem. Mas a cada dia não dá. Ver o desenvolvimento acontecer é o gosto do trabalho. Faz querer levantar de manhã. Trabalho de aspirina não é Yoga.

Yoga não se faz em um dia mas sim lentamente a cada dia. Então, já que vivemos nesse mundo cada vez mais rápido e cada vez mais descartável, façamos leituras!!! Pequenas leituras informativas. Trabalho de conscientização mesmo. De volta às origens. À época em que nos dedicávamos mais às nossas atividades. Em que ainda dávamos banho no cachorro e recebíamos telefonemas em casa.

Yoga precisa de tradição de ensino. Professor e aluno juntos. Professor e alguns alunos… não muitos. Professor e alunos juntos toda a semana se for possível. Conversando, trocando, tirando dúvidas e desenvolvendo uma relação pelo menos humana. Menos plástico-comercial artificial.

Vou começar aqui no blog a construir, pouco a pouco, esse começo essencial. Pra gente poder entender o que é Yoga e o que estamos fazendo nas aulas. Seja lá qual aula for. Não existe o método melhor. O que existe, e às vezes esquecemos, é a nossa capacidade de realmente saber o que é melhor pra gente. O começo do Yoga, acredito eu, é conseguir olhar para si, sem projeção de glórias de como deveríamos ser.

Mas sinceramente olhar para si e para a própria vida e perceber o que é preciso fazer para ficar bem. Para ficar em “equilíbrio”, como também costumam dizer. Mas para fazer tudo isso é preciso de um bom espelho. E esse espelho é o princípio do Yoga.

Não importa aqui se fomos atletas, bailarinos ou se malhamos a vida toda. O começo do Yoga é o começo do Yoga. De uma forma de olhar. É novo. E é essencial para o posterior desenvolvimento do Yoga no dia-a-dia. Pra que não não seja mais uma coisa avulsa, solta na vida da gente.

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2 respostas para “Começando pelo chão”

  1. Concordo plenamente, Manuela. Parabéns pela sua feliz observação. Eu ensino numa escola de yoga que oferece 25 aulas por semana para mais de 50 alunos. E fica difícil dar aulas diferentes o tempo todo, se isso for para apenas satisfazer a busca pelo novo. O ásana de contorção, a “tal” meditação, o pranáyáma “secreto”. É preciso que haja uma continuidade no ensinamento e isso não é possível se apenas existirem alunos “obá-obá” (aqueles que vão e vêm). Para aprender os tradicionais bhakti yoga, karma yoga, raja yoga, jñana yoga, ou mesmo hatha yoga é preciso não esquecer que se torna necessário incorporar uma nova cultura, começar pelo aprendizado do valor dos valores (yamas e nyamas) e isso leva tempo. Numa escola de yoga também será normal aprender sobre ayurveda, tantra, mitologia hindu, sânscrito, sámkhya entre outros temas. O aluno ideal é, portanto, aquele que está “sedento” pelo conhecimento ou pela liberação – mumukshutvam – e deposita a sua confiança – sraddha – no ensinamento e no seu professor. Como ensina Patanjali: ?o samadhi está próximo para aqueles que estão motivados e são vigorosos na prática? Que possamos todos continuar esse eterno aluno, receptivos e desejosos pelo conhecimento, sem expectativas e felizes. Om Tat Sat, Gustavo.

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